O presidente da Associação Comercial da Guarda revela nesta entrevista quais as razões que o levam a recandidatar-se a um segundo mandato. Para Miguel Alves, candidato único às eleições do próximo dia 8, a prioridade está na concretização de um plano de recuperação financeira da associação, mas também na possibilidade de uma «aproximação ou mesmo fusão com outras entidades associativas do distrito» para ganhar escala e reduzir custos. O empresário falou ainda sobre o futuro projeto de “Cowork”, que será apresentado após a tomada de posse.
P – Quais as razões para se recandidatar a um segundo mandato na Associação Comercial da Guarda?
R – As razões correspondem àquilo a que se propôs esta direção há cerca de três anos. Demos prioridade ao estabelecimento de um plano de recuperação financeira da Associação de Comércio e de Serviços do Distrito da Guarda, cujos resultados foram aprovados há duas semanas em Assembleia-Geral. Conseguimos uma redução significativa dos compromissos financeiros vencidos e cumprimos a nossa missão em prol dos associados, cuja perca efetiva conseguimos estancar. Pelo contrário, neste mandato o número de associados aumentou e por isso, em 2015, atualizamos a mensalidade paga. Para os associados foram feitas algumas candidaturas de apoio ao investimento, a nível de formação profissional, e a ACG investiu também nas ações coletivas, com o “The Long Weekend”, cuja segunda edição teve lugar no ano passado, tendo sido o evento que mais marcou esta direção. Ambas as edições foram concretizadas com capitais próprios. Assumimos que era importante dinamizar o centro urbano da Guarda e realizámos este evento com sucesso. No entanto, o plano de recuperação financeira não está concluído. A transição dos quadros comunitários não nos permitiu fazer o trabalho que era expectável em três anos e, por isso, fizemos no último ano um trabalho de preparação para o próximo mandato entrar em pleno. A estas eleições concorre uma lista única, encabeçada por mim, e o núcleo da direção irá manter-se. Artur Seguro Pereira continua como presidente da Assembleia e Ricardo Coelho mantém-se na presidência do Conselho Fiscal. Já os restantes elementos da direção serão divulgados oportunamente.
P – Qual foi o crescimento do número de associados?
R – Crescemos a uma média de 100 associados por ano. Entre as percas e a recuperação serão cerca de 300 novos associados neste mandato. Quando me refiro a associados falo naqueles com as quotas em dia, não estando apenas inscritos na base de dados. Definimos um novo sistema de cobrança de quotas e conseguimos apurar que o associado vê utilidade na ACG. Como já referi, temos cerca de metade dos novos projetos aprovados, que variam entre formação-ação, consultadoria direta às empresas, modernização do comércio e sistemas de incentivos de ações coletivas. Só na formação-ação e num projeto de dinamização do comércio estão envolvidas 113 empresas do distrito. Temos ainda dois esboços que já estão aprovados, o do empreendedorismo e da internacionalização para o estado norte-americano de New Jersey, que vamos colocar em prática a partir de setembro.
P – Concorre sozinho pela segunda vez. Como explica esta situação?
R – Somos lista única e vamos trabalhar da mesma forma como se não fossemos. Sempre disse que, para o bem da ACG, seria oportuno que houvesse outra lista candidata. Isso obrigaria os associados a organizarem-se e ao debate de projetos, ideias, e do futuro da associação perante os associados e a opinião pública.
P – Qual é, neste momento, o valor do passivo da ACG?
R – Em termos gerais, há três anos o passivo da ACG ultrapassava o milhão de euros e, neste momento, ronda os 200 mil.
P – No próximo mandato vai manter-se a preocupação em reduzir as dívidas?
R – Essa é uma das prioridades do plano de recuperação económica com vista à sustentabilidade da ACG. A direção propõe-se liquidar o passivo e integrar os associados, livres de quaisquer encargos. Pensámos no futuro e temos de formatar um novo modelo associativo para a cidade e para o distrito. Nesse sentido estamos a avaliar uma possível aproximação ou mesmo fusão com outras entidades associativas do distrito. Muitas vezes sobrepomos competências, discutimos associados por causa dos projetos e, neste momento, tem de haver uma estratégia em que o distrito seja a chancela que todos defendemos.
P – Como está esse processo neste momento?
R – O movimento associativo luta pela sua sobrevivência. Não é subsidiado, vive dos seus associados e do envolvimento com os mesmos. Cerca de 30 por cento das nossas despesas operacionais mensais são comparticipadas pelas quotas dos associados. São apenas 30 por cento e, por isso, temos de arranjar outras fontes de receitas próprias para manter o departamento de formação, de marketing e comunicação, financeiro, e o apoio do consultor jurídico. As associações empresariais e comerciais do distrito lutam pela sobrevivência do movimento associativo, o que muitas vezes complica e estrangula a nossa capacidade de atuação em prol dos associados. Esta possível estratégia de fusão de departamentos e, em última análise, das próprias entidades, irá otimizar o movimento. Há empresas associadas da AENEBEIRA, da ACG e do NERGA e para o bem do distrito e das nossas empresas temos de ter uma estratégia mais concertada. Há cerca de três anos foi formado um consórcio informal, o Conselho Empresarial Beiras e Serra da Estrela, que agrupa oito associações empresariais do território da comunidade intermunicipal.
P – Disse que a situação financeira da associação «ainda é muito frágil». Em que áreas se nota mais essa fragilidade?
R – A ACG não tem receitas ordinárias fixas. Gerimos o “bolo” das quotas dos nossos associados, bem como o que advém da comparticipação de projetos. As receitas são inconstantes, mas os movimentos financeiros que a associação faz com os seus fornecedores são estáveis. Já no anterior mandato, além de prestarmos serviços aos associados e de termos as quotas dos mesmos, ficámos com a responsabilidade da gestão das placas comerciais e direcionais da cidade devido à extinção da Agência para a Promoção da Guarda (APGUR). Desta forma acrescentámos uma receita própria, que é muito bem-vinda, mas precisamos que estas receitas sejam periódicas e não pontuais, como são neste momento.
P – A ACG conseguiu gerar 200 mil euros de receitas com a prestação de serviços. Acha que é possível fazer mais nessa área?
R – Sim, é possível fazer muito mais. Em 2015 a associação conseguiu que as vendas e prestação de serviços fossem sempre superiores a 200 mil euros. Vamos executar serviços e vamos vendê-los aos nossos fornecedores e a outras entidades que precisem. Eu vejo o quadro comunitário como um sentido de oportunidade onde poderemos vir a aumentar as nossas prestações de serviços.
P – Como está o comércio na região?
R – Está em fase de adaptação. O que encontrámos há cerca de três anos e que neste momento ainda verificamos é um comércio dito tradicional. Não está posicionado na nova tendência, que é o comércio eletrónico ou a Internet. Além disso, pratica horários desadequados à necessidade do consumidor e a própria oferta é também desadequada. Temos tentado que este comércio seja convertido em comércio de proximidade. Quando olhamos para os centros urbanos, nomeadamente o da Guarda, que considero o maior centro comercial a céu aberto, verificamos que temos a melhor oferta. A conversão em comércio de proximidade significa que vamos vender e tentar comercializar o que o consumidor procura em termos de produtos, horários, com sistemas de fidelização ou não, via espaço comercial ou via novas plataformas eletrónicas, nomeadamente no eComércio. Esta transformação tem acontecido graças a novos empresários mais qualificados, adaptados a estas novas tecnologias e que, antes de iniciarem um negócio, realizam estudos de mercado. Já apresentámos alguns estudos de mercado para que os nossos comerciantes reflitam sobre o que é procurado pelo consumidor e consigam ajustar o seu negócio. O comércio da Guarda recomenda-se. Comprar cá, na nossa cidade, significa estimular a economia local, é muito importante que os consumidores percebam que, desta forma, ajudam a nossa cidade.
P – Quais são as principais debilidades e constrangimentos?
R – Os maiores constrangimentos que enfrentamos dizem respeito a uma clara diminuição de poder de compra e de população consumidora. Até há uns anos verificávamos um desvio para cidades próximas, o que veio a ser estancado pelas portagens, que ajudaram o nosso comércio. Mas nos últimos anos houve uma diminuição do poder de compra e há menos consumidores e isto é preocupante. O nosso comércio não tem capacidade para atrair clientes, quer de Espanha, quer de Viseu ou Covilhã. Contudo, temos capacidade de atrair visitantes e potenciais compradores com estratégias conjuntas com outras entidades, como no “The Long Weekend” e nas atividades organizadas pelas autarquias, como as feiras locais, a Feira Ibérica de Turismo, as atividades de Natal, entre outras. Os responsáveis políticos devem ter como prioridade, para o desenvolvimento do nosso distrito, a captação do investimento. É isto que vai ditar o nosso futuro.
«Intervenção no mercado municipal foi insuficiente»
P – Relativamente ao mercado municipal, a ACG foi uma das entidades que mais batalhou para dinamizar aquele espaço. Como está a acompanhar a mudança encetada pela Câmara?
R – No início do mandato preocupámo-nos em olhar para o mercado municipal e ajudar a dinamizá-lo, fazendo com que fosse alvo de uma nova abordagem pelo município da Guarda. Fizemos o “Viva o Mercado”, em que levámos centenas de pessoas a ver o que era o mercado municipal. Neste momento o espaço foi remodelado, há uma nova estratégia e dinâmica, contudo, a ACG sempre disse ao executivo que aquele empreendimento tinha de ter uma gestão profissional. Sugerimos a criação de um condomínio que tinha de ser comparticipado pela Câmara e pelos empresários. A proposta não foi aceite ou, pelo menos, não foi alvo de discussão por parte do executivo mas parece-nos que era o que fazia sentido. Ou seja, um condomínio que definisse horários, estratégia de comunicação e marketing e dinâmicas próprias para o local. O município faz da forma que melhor sabe, mas passados três anos constatamos que o primeiro e o segundo piso encontram-se devolutos. Esta intervenção foi insuficiente. Houve uma atualização a nível de estruturas mas temos condicionalismos a nível de temperaturas e de acessibilidades que não correspondem à oferta modernizada de hoje. É inconcebível o município fazer um investimento avultado, com dinheiro dos munícipes, sem ter definido medidas para aqueles pisos. É nesta perspetiva que nós poderíamos colaborar.
ACG acolhe espaço “Cowork” para apoiar 10 empreendedores
P – A ACG vai lançar um novo projeto, o espaço “Cowork”. Qual é o objetivo?
R – O nosso território necessita da criação de empresas e de postos de trabalho, um objetivo que a ACG assumiu há cerca de dois anos desenvolvendo esforços colaborar com os empreendedores. Lançámos um guia do investidor, onde destacamos as razões para se investir na Guarda, e daqui a duas/três semanas, logo após a tomada de posse, vamos abrir o nosso espaço de “Cowork” para o desenvolvimento e maturação de projetos e ideias de negócio. O objetivo é garantir que os empresários testem as suas ideias de negócio, porque a associação tem mais de 1.600 associados ativos, ou seja, tem uma carteira vasta de potenciais clientes. Este espaço é apoiado com um sistema de incentivo de ações coletivas, existe uma estratégia definida há 24 meses para os empreendedores e eles vão ser sujeitos a workshops e serão apoiados a nível de consultadoria para desenvolverem o seu projeto. No fundo, garantimos-lhes que podem preocupar-se com o desenvolvimento da sua ideia de negócio a custos reduzidos durante cerca de seis meses, sendo que os projetos serão reavaliados ao fim deste tempo.
P – Pode concorrer qualquer tipo de negócio? Qual será a capacidade desse espaço?
R – Ainda não temos definido qual o caráter. Noutros distritos verificamos que existem “Coworks” de caráter tecnológico, por exemplo. Neste momento preferimos que seja vocacionado para o mercado comercial, de serviço e de turismo do nosso distrito. No entanto, não vamos limitar projetos de negócio que sejam viáveis no nosso território. Cada candidatura será discutida em reunião de direção. A capacidade será de dez empreendedores.
P – Há uma base de financiamento já assegurada?
R – Sim, todo o investimento, que ronda os 120 mil euros, na adequação das nossas instalações e na aquisição de equipamentos e decoração foi feito com capitais próprios. A aprovação deste sistema de incentivos, de ações coletivas com base no empreendedorismo, tem uma dotação de cerca de 300 mil euros para 24 meses, para apoiar cerca de 30 jovens empreendedores.