Não que seja obrigatório, mas será, pelo menos, de bom tom que, luso que se preze encha o peito e se junte num grito quase unânime de patriotismo. Raros foram os momentos nos últimos tempos em que a catarse se revelasse de modo tão evidente. De norte a sul ou, como antes de setenta e quatro, do Minho a Timor, a coisa foi bem clara para todos. Mesmo para aqueles que nisto de futebolices não alinham, o fenómeno não lhes podia passar ao lado a menos que, sem tugir nem mugir, se recolhessem, qual ermitão, numa ilha deserta no mais deserto dos oceanos tal foi a cobertura mediática que foi realizada. Mudasse-se de canal, passasse-se da televisão para a rádio, desta para o jornal ou deste para as redes sociais e lá estava omnipresente.
E assim, o povoléu recebeu em euforia os heróis dos novos tempos, «… aqueles que por obras valerosas/Se vão da lei da Morte libertando…». Uma multidão, acéfala como são as multidões, aguardava os novos deuses do nosso Olimpo. Foram os minutos da chegada, as horas de passeio pela agora capital do mundo, dias de discussões, semana de sensações nunca vividas.
Entretanto o mundo, como diria o poeta, pulava e avançava. Mas não, agora não era mais bola colorida. As cores continuavam negras: na Síria e no Iraque, em África e na Venezuela, No Brasil e no México. Longe, muito longe do nosso entusiasmo…
Entretanto a festa continuava alimentada a novos títulos: no atletismo, na seleção dos mais jovens, no surf, no hóquei em patins… Até os pombos quiseram dar um ar da sua graça.
Até que… até que as mentes e os corações, anestesiados pelos êxitos, deram pulo de sobressalto. No país das liberdades, no dia nacional que celebra a tomada da Bastilha, Nice sucumbia à força do terror. Um terror feito de toneladas em movimento e de corpos, muitos corpos: dezenas, centenas. Mortos uns, em agonia outros. E nós, de consciências subitamente abaladas, pregámos os olhos aos ecrãs. Quisemos saber mais, quisemos perceber sem sermos capazes. Da festa que nos inebriava passámos a um estado de alvoroço latente. E assim acordámos da letargia no meio do horror. De um horror que se torna cada vez mais frequente e que sabemos ser apátrida. Hoje em França, ontem na Bélgica, nos Estados Unidos ou em Inglaterra. E amanhã???… Bem gostaríamos de o adivinhar…
Como Sérgio Godinho, «… desculpem qualquer coisinha…» de o texto acabar por aqui. A razão é simples: tenho algo de muito importante e inadiável a fazer e por isso não tenho mais tempo. Tenho de ir procurar Pokémons!!!…
Por: Norberto Gonçalves