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Dois países, a mesma luta

Espanhóis e portugueses defendem a recuperação da linha ferroviária entre Barca d’Alva e La Fuente de San Esteban

Várias dezenas de pessoas, dos dois lados da fronteira, reclamaram no último domingo a reactivação da linha ferroviária entre Barca d’Alva, no concelho de Figueira de Castelo Rodrigo, e a localidade espanhola de La Fuente de San Esteban para fins turísticos. Numa altura em que se assinalam os 150 anos do Caminho-de-Ferro em Portugal, a associação espanhola “Camino de Hierro”, sediada em Salamanca, associou-se às comemorações, promovendo a IVª “Fiesta del ferrocarril” na aldeia duriense.

Durante todo o dia foi possível assistir ao “beijo” entre duas “engenhocas ferroviárias”, uma espanhola e outra portuguesa, que se tocaram a meio da ponte internacional sobre o Águeda, de forma a reviverem a dupla inauguração da conclusão da ponte e da linha Porto-Salamanca. O público teve então oportunidade de passear nestes improvisados comboios, sendo que o espanhol tinha a curiosidade de ter uma mota a fazer de “motor”. Outro objecto que suscitou olhares curiosos foi uma grande maqueta ferroviária realizada pela associação dos “Amigos do Caminho-de-Ferro de Salamanca”. Patente em plena ponte esteve também uma exposição fotográfica sobre “O caminho impossível para Portugal/Espanha”, com fotografias e textos bilingues. A música também não faltou. Contudo, o grande objectivo deste evento, pela primeira vez em solo português, foi mesmo «chamar a atenção para o estado de degradação da via, sensibilizar para a sua reabilitação e reabertura no futuro, porque ela continua a ser viável segundo vários estudos a que pudemos ter acesso», frisou Carlos Abreu, membro português da “Camino de Hierro”.

De resto, para este “apaixonado” pelos comboios, «não há desculpa do lado português para que isso não aconteça», até porque a reabilitação de um troço de 28 quilómetros, onde o tráfego está suspenso desde 1988, «custa tanto como construir dois quilómetros de auto-estrada», afiança. Na sua opinião, trata-se de uma «via importantíssima para nós, para o país e, em específico, para a região do Porto, enquanto via ferroviária de mercadorias porque é a única directa» que a cidade invicta tem para Madrid. Carlos Abreu salienta ainda que vários estudos realizados por especialistas revelam que «basta apenas reforçar as pontes nestes 17 quilómetros entre Barca d’Alva e La Fregeneda para tudo o resto ficar operacional». António Edmundo, presidente da Câmara de Figueira de Castelo Rodrigo, também marcou presença – mas «como civil» – nesta iniciativa da sociedade civil. Quando se comemoram 150 anos do comboio em Portugal e mais de 100 anos sobre a ligação ferroviária entre o Porto e Salamanca, o edil considera ser «altura de se equacionar verdadeira, racional e objectivamente, com custos verdadeiros, o que se pode fazer para recuperar a via do Pocinho até La Fuente de San Esteban para fins turísticos».

Aliás, «o que era uma utopia há uns anos ou impensável dados os custos envolvidos» pode ser agora concretizado, acredita o autarca, tendo em conta que os valores «podem ser equacionados de outra forma, já que a tecnologia avançou e não precisamos de material circulante para grandes velocidades». É que circular a 50 a 60 quilómetros por hora chega «perfeitamente» para o aproveitamento turístico da linha e, nesse sentido, diz-se convencido de que 15 milhões de euros chegariam para reabilitar a ferrovia do lado português, entre o Pocinho e Barca d’Alva. «Trata-se de um investimento transversal a toda a região e rentável» no futuro», acredita. Para António Edmundo, o mais difícil de garantir é mesmo a via ferroviária, porque «já haverá entidades privadas a estudar a possibilidade de explorar» o material circulante. Actualmente chegam a Barca d’Alva uma média de 42 mil turistas por ano pelo circuito fluvial. Também os habitantes da localidade recordam com saudade o tempo em que os comboios chegavam à aldeia: «Gostava de ver esta linha novamente em funcionamento porque ficámos muito isolados», reclamou Amélia Bordalo, que reside mesmo junto à antiga estação.

Ricardo Cordeiro

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