Depois deste título idiota, perguntar-se-ão os leitores para que raio lhes interessará conhecer os meus afazeres em cada dia da semana para escrever isto. Talvez só agora se tenha posto a si próprio essa questão. No entanto, há 111 semanas que vem aqui ler uma coluna chamada Diário Interior. E ler o diário dos outros chama-se voyeurismo, curiosidade ou amor de mãe. Ora, como 111 artigos cheios de pensamentos vazios não têm qualquer aspecto curioso nem a minha mãe lê os artigos – e daí as liberdades de linguagem que já tomei bastas vezes – a consulta regular desta coluna só pode ser entendida como um acto de desespero justificado pelo fim do Big Brother.
Domingo
Não sou católico, mas respeito o dia de descanso. Aliás, respeito-o tanto, que sempre que possível, prolongo esse descanso entre um domingo e o outro.
Segunda-feira
Para ter assunto para o artigo que hei-de escrever, vou anotando as ideias e as notícias mais marcantes num caderninho de capas pretas, a que não ligarei nenhuma quando precisar de me sentar ao computador para escrever. E nem sequer é por diletantismo. O habitual é que não saiba onde pára o Moleskine (chamam-se assim estes cadernos e é chique dizer que se tem um) e quando o encontro tenho dificuldade em compreender o que lá havia escrito.
Terça-feira
Em condições normais, escrevo este Diário nas madrugadas de segunda para terça, embora por vezes, circunstâncias especiais (que sucedem apenas umas três semanas por mês) me obriguem a terminar o texto quinze minutos antes do jornal seguir para a gráfica. É nesta altura que penso no assunto com que irei aborrecer os leitores na quinta-feira. Passo em revista os temas que me possam parecer mais interessantes e actuais para manter o público informado e elimino-os. O director e os colunistas do meio do jornal decerto tratarão disso. Fico-me pelas inutilidades.
Quarta-feira
Arrependo-me de dois terços dos parágrafos do artigo já enviado e lembro-me de umas dez brilhantes ideias e cinquenta óptimas frases que devia ter usado. Não consigo encontrar o sacana do caderno preto. Esqueço-me de tudo e na semana a seguir vai ser a mesma cegada para escolher um tema para o artigo.
Quinta-feira
Saio de casa, vou à caixa do correio buscar O Interior e o pagamento do artigo, passo no banco a depositar o jornal, volto para casa e sento-me calmamente no sofá a ler o cheque.
Sexta-feira
Vem a empregada e leva os cheques já lidos para reciclar. Pede-me apenas que faça uma assinatura na parte de trás. Não percebo este desejo contínuo por autógrafos. Seja como for, é notável a sua preocupação pelo ambiente.
Sábado
Sai o jornal do saco, com notícias relevantes sobre a quantidade de homens que pagam para ter sexo, sobre as novas namoradas dos políticos e estrelas da televisão ou sobre a candidatura de Cavaco Silva. Nem saio de casa. O jornalismo monotemático sobre prostituição não me seduz.
Por: Nuno Amaral Jerónimo