Arquivo

Dia sem carros

Não sei se o leitor está habituado a andar a pé em vez de andar de carro (a língua portuguesa é um espanto). De qualquer forma, para quem pratica exercício, seja ele marcha ou corrida, há uma regra de ouro que deve ser respeitada, sob pena de, ao ser infringida, provocar um efeito oposto ao desejado. A lei é ao mesmo tempo simples mas científica: o nível de esforço deve ser proporcional às capacidades físicas de cada um. Caso contrário a sensação de prazer e cumulativamente a vontade de novas actividades do género decai e cada vez se torna mais difícil conseguir que o indivíduo repita a experiência. Dou um exemplo: as provas de corrida de média e longa distância como são os conhecidos corta-matos escolares senão forem preparados convenientemente, através de um treino sistemático em que o aluno aprende a dosear a intensidade e o volume do esforço, no fundo a gerir as suas capacidades, pode tornar-se um pesadelo no momento da competição. É assim que muitos dos nossos jovens acabam por pôr de lado a vontade de correr. Participam em provas competitivas sem estarem minimamente preparados e chegam ao fim exaustos e sem vontade de repetir a experiência. Pode parecer que este arrazoado meio pedagógico meio científico não faça muito sentido mas tente-se agora aplicar este princípio à vida diária. Como calcorrear os dois ou três Km que a nossa Autarquia obrigou cada um de nós a fazer? Ontem foi o dia sem carros. Não sei quem o decidiu (um iluminado, por certo) mas a Autarquia, depois de duas ou três más experiências em anos anteriores, decidiu novamente retomar o programa do ano europeu sem carros. Já estou a ver a nossa querida presidente do Município a subir a custo a ribanceira da Senhora dos Remédios e a chegar cá acima a arfar e a jurar para nunca mais. E à hora do almoço, por certo adoptará a decisão mais sensata, o repasto no centro da cidade pois a caminhada a seguir ao almoço é mais do que indigesta. Dia sem carros na Guarda, deve ter sido bom para uma percentagem ínfima de pessoas. Aquelas que estão treinadas a andar e para quem uma passeata de dois ou três Km não é nada. Essas vão ser as pessoas que vão agradecer a falta de carros no centro. Mas para a grande maioria, aquelas que não estão habituadas a andar, vai ser um pesadelo.

E como o artigo, sem querer, já vai extenso acabo com uma ideia alternativa para resolver o problema. Em vez de um dia sem carros, faça-se uma semana ou uma quinzena. Mas antes componham-se os passeios e as ruas de forma a que se possa andar sem perigos de tropeções ou de atropelamentos. Depois, então sim, mas sempre com a devida e cuidada antecedência (não como agora em que mais de metade da população não sabe o que lhe tramaram para amanhã) e de uma forma explícita e clara (não como agora, em que se afixaram mapas nas montras dos cafés mais indecifráveis do que os mapas da caça ao tesouro) informem-se os munícipes do dia e da hora em que a prova terá início. Talvez assim a experiência seja menos traumática.

Por: Fernando Badana

Sobre o autor

Leave a Reply