A unidade de internamento e um hospital de dia são os dois únicos projectos que a Casa de Saúde Bento Menni não conseguiu concretizar na Guarda ao fim de dez anos de existência. Duas iniciativas que os seus responsáveis já se resignaram a não pôr em prática dada a «falta de interesse e vontade» dos dirigentes da Saúde no distrito e na região Centro. Anália Oliveira, fundadora e antiga directora da instituição, actualmente presidente do Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus em Portugal, lamenta terem sido «dois passos» que a Casa de Saúde nunca conseguiu ultrapassar: «Infelizmente, as entidades oficiais só vêem a parte económica e não a qualidade assistencial que se pode dar a este tipo de pessoas», considera.
A situação foi recordada a “O Interior” na última sexta-feira à margem das comemorações do décimo aniversário da instalação na Guarda da Casa de Saúde Bento Menni, localizada no bairro da Luz. A cerimónia ficou marcada por um colóquio sobre a obra de São Bento Menni ou o colégio de Aldeia da Ponte, mas também pela inauguração da exposição “Andarilhanças de Bento Menni” e da inovadora Sala de Snoezelen. E nem mesmo aqueles dois fracassos fizeram esmorecer o ambiente de festa. A irmã Anália Oliveira garante que a Casa de Saúde sempre lutou pela unidade de internamento, mas que «lamentavelmente» a ARS do Centro limitou logo o projecto ao garantir apenas o financiamento do internamento até 75 pessoas. «Um limite impossível para nós, tanto mais que temos tido tantos pedidos e sabermos das inúmeras necessidades existentes na zona», refere, lastimando que ninguém na ARS tivesse pegado «a sério» no projecto. «Se o doente tem direito à livre escolha do sítio onde quer ser tratado, porque é que não se lhe dá essa liberdade», acrescenta, lembrando que a Casa de Saúde está «legitimada e aprovada» pelo Ministério da Saúde.
Governo Civil ajudou Sala de Snoezelen
Outro projecto inviabilizado é o hospital de dia, que nunca funcionou. «Sabemos hoje que ter os doentes em hospitalização parcial é uma estrutura para a qual se caminha. Nós julgávamos que era um bom equipamento para a zona, pois evitava muitos internamentos, mas também nunca conseguimos concretizá-lo», adianta a irmã Anália, que se diz surpreendida com o facto de «não haver a preocupação de se desenvolverem e apoiarem projectos destes sucedido numa região tão necessitada e carente como esta». Por tudo isso, a Casa de Saúde Bento Menni pode vangloriar-se de ter feito «quase tudo» às suas custas, até porque é «auto-suficiente, embora seja obrigada a gerir muito bem» os recursos de que dispõe. «Também temos fases complicadas, sobretudo quando o Estado se atrasa a transferir as comparticipações. Tirando isso, acho que os nossos meios têm-nos permitido inovar cada vez mais na prestação de bons cuidados de saúde aos utentes», considera.
Exemplo dessa inovação é a novíssima Sala de Snoezelen, um verdadeiro espaço de despertares. Carla Costa, psicóloga clínica e responsável pelo serviço, explica que o espaço pretende estimular os sentidos de utentes com deficiências profundas, mas também pessoas com Alzheimer ou que tenham sofrido Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC). «É uma sala onde os doentes se vão descobrindo aos poucos e têm uma sensação de bem estar. É um espaço para sentir em vez de pensar, mas sobretudo para estar com o outro – daí a presença de tantos técnicos – para que os doentes possam estabelecer uma relação», refere, adiantando que a sala vai funcionar com um máximo de três utentes em sessões de meia hora, acompanhados de dois técnicos. «Se não for na relação que estabelecemos no afecto, no toque, no cheiro, na visualização de símbolos estranhos, pouco mais lhes podemos dar, porque, a nível cognitivo, têm as suas capacidades completamente deterioradas», acrescenta a psicóloga, para quem até os técnicos e colaboradores da Casa de Saúde poderiam usufruir dos benefícios da sala, que permite um «óptimo nível de relaxamento». A Sala de Snoezelen – sigla feita com as primeiras letras das palavras que identificam os sentidos em holandês – custou 10 mil euros, sendo que o Governo Civil da Guarda patrocinou a compra de um colchão de água musical orçado em três mil euros. A Casa de Saúde Bento Menni guardense é um dos 12 centros do Instituto das Irmãs Hospitaleiras existentes em Portugal, tem 160 camas, já tratou 536 doentes em internamento desde 1994 e acolhe actualmente 159 utentes.
Luis Martins