Arquivo

Decisões avulsas

Comentário

Não há fome que não dê em fartura! Depois de anos de carência de estacionamento no centro da cidade da Guarda, a autarquia decide avançar, em simultâneo, com dois parques de estacionamento subterrâneos.

A decisão é surpreendente e tem um cariz, claramente, eleitoralista. A autarquia não decide de acordo com qualquer estudo que sustente a decisão, mas apenas com o ensejo de agradar a todos. Depois do “buzinão” promovido pelos comerciantes do Centro Histórico, Maria do Carmo assumiu com a ACG o compromisso de criar um estacionamento subterrâneo junto à escola de Santa Clara. Segundo o caderno de encargos este deverá ter 500 lugares de estacionamento, para substituir os que havia na Praça Velha (a ACG diz que eram 300, mas, na verdade, e mesmo ocupando os passeios, não chegavam a 100…). Por culpa desse compromisso, e para evitar mais contestação, a autarquia concordou com a ACG em atrasar o lançamento do concurso para o subterrâneo do José de Lemos e assim avançar com os dois ao mesmo tempo. Assim, um concurso que já devia estar na fase de adjudicação está ainda em aberto até 16 de Março. Com esta decisão atrasa-se o lançamento da obra em muitos meses. Se tudo correr bem os dois parques de estacionamento estarão em construção durante a campanha para as próximas autárquicas e servirão de argumento para os candidatos socialistas.

O concurso público prevê que a concepção, construção e exploração seja da responsabilidade do vencedor e sem qualquer custo para a Câmara. A questão é saber se haverá candidatos para assumirem tão elevados investimentos, e logo aos pares. Como não existem estudos sérios sobre a necessidade ou viabilidade de dois parques com estas características – que distam entre si menos de duzentos metros – não é muito provável que possam aparecer muitas empresas com disponibilidade financeira para avançar com os dois empreendimentos em simultâneo (e não quero com isto dizer que não façam falta, mas as decisões deste cariz não podem ser tomadas de acordo com o empirismo de quem passa pelo centro e observa dificuldades em estacionar, mas sim de acordo com uma análise técnica das necessidades).

Quanto à reivindicação da ACG de construção de um estacionamento subterrâneo como a «salvação» do comércio do Centro Histórico, parece-me pouco honesta. Na verdade, nenhum estacionamento, só por si, pode servir de panaceia para resolver os problemas do comércio tradicional. De resto, sem haver primeiro uma zona pedonal alargada não haverá sucesso para o parque de estacionamento junto à Santa Clara. Quando em Novembro de 2003 apresentámos neste jornal algumas sugestões para a requalificação da cidade, defendemos que a Rua Alves Roçadas fosse toda fechada ao trânsito (da Misericórdia até ao Jardim José de Lemos). Com o lançamento de dois parques de estacionamento essa sugestão ganha outra dimensão. Para que os parques façam sentido, é necessário que a Alves Roçadas seja uma rua pedonal. Só desta forma poderá haver pessoas a deslocarem-se entre as lojas do comércio tradicional. De outra forma, duvido que alguém possa ter interesse em estacionar no parque de Santa Clara para ir fazer compras ao Centro Histórico.

O erro da Câmara em ter adiado sistematicamente a resolução do problema de estacionamento é assim decidido de forma abrupta, mas sem grande discernimento ou critério.

Aguardemos pois pela construção dos parques… Até lá desenrasquem-se.

Luís Baptista-Martins

Sobre o autor

Leave a Reply