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De Olhos em Bico (Parte Um)

Corta!

«Em 1988, Deo-soo, um homem casado e com uma filha, é raptado e aprisionado sem qualquer motivo num quarto de hotel. Quinze anos depois ele é libertado e recebe algum dinheiro, um telemóvel e um fato novo. Desorientado, e sedento de vingança, ele luta para descobrir a razão pela qual foi preso. Mas, à medida que o derradeiro confronto se aproxima, Da-soo descobre um segredo terrível». Reza assim a sinopse do mais recente filme de culto a passar pelas salas portuguesas. Apadrinhado por Quentin Tarantino (e o quanto isso vale!), e vencedor do Grande Prémio da última edição de Cannes, Old Boy – Velho Amigo, do sul-coreano Park Chan-wook, vem rodeado de tal hype que os mais cépticos a estas modas e exaltações, só podem desconfiar. O Corta! a isso, não consegue dar resposta. Este é mesmo daqueles filmes que será amado por uns e desprezado por outros tantos.

Talvez um filme como este só mereça de facto todo o destaque que lhe é dado, pela ousadia de ser diferente, quando tudo em volta é tão banal e respeitador de normas tão restritas e ultrapassadas. Aqui tudo se joga nos limites, ou até para lá deles. Nem sempre obtendo os melhores resultados.

A ideia base de Old Boy é excelente. Um homem, personagem kafkiana, acaba preso durante quinze anos sem que nunca ninguém lhe diga os motivos de tal. O problema começa na sua libertação. Se até aí o espectador sabe tanto quanto a personagem: nada, após a saída desta cá para fora, há desde logo uma questão que fica mal resolvida, e que irá afectar todo o filme. Nada deve acontecer por acaso num filme. Os motivos importam. E quando estes não existem, nós vamos em sua busca de imediato. Incessantemente. A personagem de Old Boy não descobre tal falácia, nós (espectador minimamente atento) não a iremos conseguir esquecer. A libertação porquê? E por ordens de quem? Após quinze anos, nada poderá acontecer por acaso.

No meio de tanto filme sem sal, Old Boy acaba por surpreender, mas aconselha-se moderação. A montanha poderá, desta vez, não ter parido um rato, mas Old Boy, no máximo, não passa de um gato. Selvagem, sim. Agressivo e imprevisível quando acossado, também. Mas um gato, pouco maior que um rato, se comparado com a montanha que o criou.

Segunda Oportunidade

O que levará alguém a ver o mesmo filme mais que uma vez? Quando já tudo se sabe e poucas surpresas parecem poder vir a acontecer num novo visionamento? Uma obsessão? Paixão? Algo que ficou mal resolvido aquando da primeira vez que o filme foi visto? Aqui no Corta! com Million Dollar Baby, algo não correu bem quando o filme foi visto inicialmente. Uma futura visita ficou na altura prometida. Como tantas vezes acontece e quase nunca se cumpre, após adiamentos constantes. Desta vez tal não aconteceu. A beleza e perfeição que se adivinhava na última obra de Clint Eastwood, fugazmente deslumbrada da primeira vez, transformou-se agora numa confirmação.

Este ano dificilmente surgirá melhor. As palavras não chegam para descrever tudo o quanto de bom nele existe. Melhor poderia não ser impossível, mas quase.

Por: Hugo Sousa

cinecorta@hotmail.com

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