Arquivo

Das vacas gordas à carne podre

Tenho saudade dos outros tempos, não muito recuados… (Como o tempo não anda para trás e a retoma se afigura uma miragem perdida, qual oásis desejado em pleno deserto, esses tempos fazem parte de um sonho longínquo do qual só posso guardar a saudade.) Era o tempo das “vacas gordas”!

Alguns gostam de referir-se a essa expressão ofensiva e sarcasticamente, usando-a de forma a defenderem-se mas não resolvem nada. Era uma economia forjada, todos sabemos, levemente sustentada como se de nuvens se tratasse. Mas tenho saudades desse tempo. O tempo em que se vivia acima das possibilidades, o tempo em que a crise se avizinhava mas se ia adiando, como outra coisa qualquer que se deixa para fazer amanhã, mas hoje não.

Tenho saudades desse tempo: não havia tanto desemprego, nem fábricas a fazer as malas à socapa e a fecharem as portas de fininho; não havia greves desesperadas para reivindicar o pagamento do que é devido, por lei; não havia subidas constantes do petróleo e, consequentemente, de tudo… E sobretudo, tenho saudade dos acertos do ordenado, apenas para compensar a inflação…

Tenho saudades do tempo em que os noticiários não abriam com manchetes das torturas, dos horrores do terrorismo… e aqui tão perto! Os noticiários faziam manchetes de notícias de ministros que se demitiam à mínima suspeita, mesmo que se provasse a sua inocência, mais tarde, mas fora do tempo…

E agora? Os ministros afinal também se “esquecem” de pagar impostos… e por ignorância!? É que errar é humano, mas afinal os computadores, ultimamente, têm sido responsáveis por muitas asneiras, senão veja-se o exemplo dos concursos de professores… O meu filho, com 12 anos, costuma dizer que errar é humano mas pensar também é. Por isso, deixem-me dar um conselho ingénuo de quem tem saudades do passado e se entristece com um presente que anuncia um negro futuro para este país:

«Errem menos, senhores governantes e pensem mais».

Foi para isso que os eleitores portugueses que votarem no actual Governo os elegeram, não defraudem mais as suas expectativas, se puderem, claro… É por estas e por outras que tenho saudades do tempo em que se temia o pior mas não se vivia na pior e é por isso que as “vacas gordas” deram lugar à actual carne podre…

Helena Seabra, Guarda

Sobre o autor

Leave a Reply