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Creche aberta quase 24 horas por dia

A rotatividade e os horários laborais dos pais norteiam a vida dos filhos

Ainda o sol não nasceu quando algumas crianças chegam ao “Recreio Infantil”, alguns já vêm bem acordados e a tagarelar, outros chegam de pijama e cobertos por uma manta. Mas, como ainda é muito cedo, acabam sempre por dormir mais um bocadinho. A rotatividade e os horários laborais dos pais norteiam a vida dos filhos. Muitos não têm onde deixar os pequenos, por isso socorrem-se dos serviços desta creche na Guarda, que está aberta mais de doze horas por dia.

«Agora, quando vou para casa ainda é dia!», diz com satisfação o Rafael, com 4 anos, enquanto molda um pedaço de plasticina. «Mas, quando chegamos ainda é de noite», diz de imediato Marcelo, com meia dúzia de anos. A Jessica, também faz parte do grupo que chega por volta das 6h30, mas como é a mais nova da sala, é também a mais envergonhada e calada. O silêncio só é interrompido para pedir mais plasticina à educadora. Mais tagarela é a Iara, que faz as “honras da casa” e apresenta o resto dos companheiros, que estão na sala. «Somos todos amigos», dizem os petizes em coro.

«Ela já costuma vir bem acordadinha», graceja a mãe da Jessica, Cristina Cameira, quando a foi buscar por volta das 16 horas. «O horário da creche adapta-se ao meu horário laboral», destaca a jovem mãe, «o que é óptimo», adianta. Começa a trabalhar às 7 da manhã, na fábrica da Delphi, por isso «tenho que a trazer comigo, não tinha onde a deixar», garante. Também Joaquim Augusto e a esposa, trabalham no mesmo turno, naquela unidade fabril, por isso, o filho chega à escola às 6h30, «nós não temos outra opção», constata o pai. Eventualmente, «esta creche deverá ser a única na cidade, procuramos outras com este horário e não encontrámos», recorda Joaquim Augusto. Assim, o miúdo fica na escola, enquanto os pais estão a trabalhar, «e nós também ficamos mais descansados», assegura Joaquim Augusto. O mesmo acontece com os pais do Rafael, ambos a laborar no mesmo turno, também não tinham onde deixar o filho: «foi o único sítio que encontrámos», refere Antonieta Nunes. Para além dos pais que trabalham na fábrica de componentes automóveis, há outros com diferentes profissões, sem horários ou com outros turnos. Como o Ismael Marcos, repórter de imagem, que vai buscar a filha, conforme o seu trabalho, «às vezes venho buscá-la mais cedo, mas também sei que a posso deixar até às 20 horas se for necessário», sublinha. O horário é «bastante flexível», reconhece.

A creche, que fica na Rua Cidade Bejar, não está aberta 24 horas, mas pouco falta. Antes, fechava depois da meia-noite, por causa dos turnos nocturnos da Delphi, agora que acabaram, abre ainda mais cedo. Abre às 6h30 e encerra por volta das 23 horas, «por causa dos pais que trabalham na restauração ou nos supermercados», justifica Cristina Monteiro de Jesus, proprietária do “Recreio Infantil”. Foi para «colmatar esta necessidade que os pais sentem» que nasceu esta creche, em Agosto do ano passado, indica a responsável. Ali, «o horário de funcionamento é adaptado ao horário dos pais», garante.

Além demais, também é possível comprar pacotes de horas, ou seja, um serviço “babysitting”, sem marcação prévia. «Às vezes, acontecem imprevistos, algum familiar que adoece ou alguma reunião inesperada e os pais não têm onde deixar os filhos», explica a proprietária, e «isso tem acontecido várias vezes. Ainda no Dia da Mulher o serviço foi muito requisitado», dá como exemplo. É que a partir das 20 horas diminui o número de crianças e «como o espaço é grande, esta é uma forma de ser rentabilizado», esclarece.

Aprender e brincar

Nas três salas há quase sempre cerca de oito crianças, que estão sempre a rodar, por causa dos turnos dos pais, quando saem uns, entram outros. Na sala dos bebés brinca-se e aprende-se a dar os primeiros passos, na sala ao lado, as crianças com dois e três anos, brincam e não só. «Hoje vamos aprender as cores», exclama Andreia Santos, professora do 1º ciclo, enquanto tenta pôr ordem na sala. Para os sossegar, basta colocar os vídeos: “Doidas andam as galinhas” ou “Eu sou um coelhinho”. Aí, todos trauteiam e seguem a coreografia da professora. «É a nós, educadores, que nos compete brincar e ensinar as crianças», frisa a jovem docente, «porque hoje os pais têm cada vez menos tempo para isso, por vezes já chegam a casa muito tarde», acrescenta. Por isso, desenvolve diversas actividades lúdicas e de aprendizagem com os pequenos aprendizes. Da mesma opinião comunga Sandra Marques, a educadora que está na sala dos mais crescidos, até aos seis anos. «É essencial este acompanhamento pedagógico com as crianças», conclui.

Patrícia Correia

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