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Contra a lamúria (I)

Os jornais andam cheios de lamúrias; e, com eles, a consciência nacional, mal de que só as excepções escapam. Aqueles, porém, fazem-no com a mesma consciência com que, há anos, com a entrada para a CEE (agora, pomposamente, “União Europeia”) nos prometiam “leite e mel” ao virar da esquina…

Nada há mais aterrador – atrevido, catastrófico – que a ignorância, que a incapacidade de pensar, de pensar-se; nada há mais aterrador que cuidar-se que o saber está nos liceus ou em universidades. Como é possível falar sobre Portugal ou o povo português sem lhes conhecer a fundo a sua História e a sua idiossincrasia, sem saber que o estudo, mais que ser a humilde, viril e determinada atitude de uma Vida é, antes de mais, um princípio que decorre da Ética, da Moral e – acima de tudo – da mais alta auto-estima própria? Ora, a auto-estima própria nada mais é que a extensão de uma postura eminente, altaneira, optimista, indefectivelmente religiosa, postura cuja vitória está assegurada, à nascença, se o ambiente da casa onde se nasce for de impolutos princípios, seriedade.

Venha a Vida com as suas surpresas e desafios – ambos e sempre abençoados!! Para ela o Decálogo e pouco mais chegam. Um optimismo tão pleno e maravilhoso aí está – e para além de todas as palavras.

Após a tropa e a guerra, a Universidade e a docência por outras paragens regressei à Guarda em IX-1979. Mais ou menos por essa altura precisei de ir à Véritas comprar algo. Cheguei antes da hora e decidi aguardar até às 15. Um conjunto de sacerdotes esperava igualmente. Era um conjunto de manifestamente idosos que trocava entre si chocarrices e futilidades que me deixaram profundamente incomodado. Todavia, se a personalidade portuguesa é tão marcante ela se deve a um Catolicismo tão fundo que logo em Martinho de Dume e Frutuoso de Montélios tem das suas primeiras figuras. E não é nenhuma crítica aos próceres religiosos locais. Se há figuras a quem me sinto ligado por um profundo afecto são o nosso Bispo D. António dos Santos e o seu secretário Pe. Dr. Manuel Cartaxo. Infelizmente, porém, foi conversa, a da chocarrices, que nunca tivemos, a despeito de várias vezes combinada. Indisponibilidade minha.

Essa figura cimeira da psicologia francesa, que aqui citei no último artigo, escrevia-me em Agosto transacto, após ter visitado Portugal pela primeira vez (visita para a qual lhe dei e confirmei a chave): «Portugal encantou-me; é como um país de coração. Os portugueses são abertos e têm muito mais qualidades que os franceses. Vi coisas belíssimas em…».

Esta excepcional qualidade que o português tem de se insinuar, ser aceite e querido – única no mundo? – não deve ser novidade para ninguém. Nas minhas voltas pela Europa, como, durmo, banqueteio-me e sou integrado na própria comunidade, desde a Andaluzia ao Levante, da Holanda à Alemanha. Por sua vez, estes amigos vêm passar dias a minha casa. É a mesma aptidão que leva a que franceses já me tenham dito: «Quem fica com as chaves da minha casa em Agosto, bem como da de amigos, é a mulher-a-dias portuguesa. Quando regresso sei que está tudo absolutamente tal qual». E, em Saint Cyprien (Conques), um homem extremamente generoso que não me quis nada por quatro litros de gasolina, visto eu, pela atenção, lhe ter ofertado duas garrafas de Porto, dizia-me, algo emocionado: «Tenho trabalhado com portugueses. São gente formidável (des braves gens)».

Portugal é o que deu (dá) «novos mundos ao Mundo», é um Agostinho da Silva e pôr o seu futuro nos carris da sua História é instante; sem embargo, é claro, de todas as lídimas atitudes que melhorem a Grei.

Guarda 13-V-06 (continua…)

P.S.: Por lapso, na comunicação que aqui dirigi ao sr. Director-Geral da Polícia de Segurança Pública (edição n.º329, de 13/04/06), o nome do agente elogiado, Fernando Lima, apareceu errado. Pelo facto, as minhas desculpas ao dito agente e aos leitores. Um louvor também a Luís Soares, da mesma PSP.

Por: J. A. Alves Ambrósio

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