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Coisas…

Basta olharmos para as notícias acerca da constituição das listas de candidatos a deputados para concluirmos que todos os vícios desta nossa democracia se encontram bem de saúde e recomendam-se.

A existência de círculos eleitorais baseados nos diferentes distritos do país, não passa de mais uma “ingenuidade” do nosso sistema de representação democrática. A chamada “classe política” – conjunto de cidadãos com esperteza e vocação para o exercício da intriga politico-partidária – lida optimamente com as regras que ela própria criou e que lhe permite uma alternância mais ou menos satisfatória no desfrute de tachos, panelas e outros instrumentos de sobrevivência. Para que a coisa resulte, no entanto, é necessário, de tempos a tempos, passar pelo frete do chamado processo eleitoral no qual vestem um fato de macaco, vão ao dentista branquear o écran, tomam doses generosas de lata e atrevimento, um ou outro recorre mesmo ao prozac e aí estão eles prontos para tudo (ou quase) em busca da certidão que lhes permitirá renovar o contrato por mais uns anos.

Em todo este processo de distribuição de lugares há cada vez menos pudor na forma como se explora a ingénua democracia e se chupa o sangue do cidadão eleitor. A forma como nas sedes partidárias se conduz a distribuição do bolo mais parece um gigantesco jogo de monopólio: as concelhias bem tentam berrar, as distritais, sobranceiras, nem lhes ligam mas por sua vez são engolidas e ignoradas pelas sedes nacionais que apenas estão interessadas em colocar no parlamento aquelas ilustres figuras (os amigalhaços de Lisboa) nem que para isso tenham que inventar afinidades inexistentes ou parentescos de 10ª geração. Na prática, este tipo de jogadas permite-nos dar umas boas gargalhadas azedas ao vermos o senhor Menezes de Gaia jurar amor e dedicação a… Braga; a tentarmos adivinhar se Pina Moura vai voltar à esplanada do Caçador a estudar dossiers guardenses durante 2 semanas para nunca mais cá pôr os pés nos anos seguintes; a perguntar-nos que raio é que aquele ministro mal-encarado tem que ver com Castelo Branco; a descobrir que diabo tem a viúva de Sousa Franco ou a vira-casaca de Zita Seabra que ver com Coimbra; qual será a terrinha que vai ter que gramar com Paulo Pedroso; ou, também, como pode continuar Ana Manso a acumular cargos de eleição democrática que funcionam a mais de 300 Km de distância um do outro. Cheira a palhaçada.

Este começo do processo pré-eleitoral diz-nos que, não só está tudo na mesma, como vai continuar tudo como está.

A perversidade maior está, no entanto, na total impotência para combater o sistema. Está tudo previsto: quem vota em quem, quem está em lugares elegíveis (o chamado lugar-tacho), quem não vai sequer votar e até que não encontra melhor solução do que votar em branco ou destruir o boletim.

Solução: não há.

Por: António Matos Godinho

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