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Coisas…

Vai haver negócio! Finalmente, ao fim de não sei quantos anos, vai ser aberto o concurso para aquisição de umas centenas de carros de combate, que vêm substituir as famosas mas obsoletas “chaimites” que conseguem ser mais velhas do que eu. Ficamos todos muito mais tranquilos e nem mesmo a pipa de massa que aquilo vai custar nos consegue refrear a euforia. Afinal, o que são mais alguns milhões de contos pagos em não sei quantos anos? Uma bagatela. Não vai haver, a partir de agora, castelhano que nos assuste, árabe que nos invada ou comunista que nos tome. Fidel não tem hipóteses, Bin Laden que se cuide. Faremos a inveja dos nossos parceiros da NATO. Tornar-nos-emos verdadeiramente inexpugnáveis com a vantagem de, indirectamente, conseguirmos uma série de outras conquistas: generais entretidos a fingir que comandam (passam a ser mais uns tantos a juntar aos que já há); estágios de pilotagem para uns “betinhos” da Academia; mecânicos sonolentos com imaculados fatos de macaco, passam a ter que fazer; florescerá o negócio de sobressalentes; as reuniões dos altos e baixos comandos das forças armadas passarão a ser muito mais interessantes, não se limitando a discutir qual a farda a usar na próxima parada. Ah! Já se me escapava: o orgulho pátrio, o aceno dos nossos igrejos avós; um ou outro ditador sorrirá na tumba pensando do Além que, afinal, ainda não está tudo perdido.

E ainda faltam submarinos, helicópteros e espingardas. No fim da dura batalha da compra, haverá medalhas e vivas para todos, no 10 de Junho, por actos de heroísmo cometidos durante o regateio.

Mas o facto é que quem paga isto tudo somos nós. Será que as coisas dão para combater incêndios? Ou cheias, já que vem aí o inverno? Equipam hospitais? Aumentam a segurança nas ruas? Vigiam fronteiras? Diminuem o tráfico de drogas? Fazem subir a taxa de alfabetização?

Compreendem-se mal estas trapalhadas. Para o comum dos portugueses, que vê novelas e telejornais, interessa pouco essa lei pomposa a que chamam de Programação Militar. Interessa muito, isso sim, saber se o dinheiro chega até ao fim do mês.

Eu confesso que não percebo. Sempre me ensinaram que quando um gajo se quer divertir sozinho, usa a mão direita e, quando quer variar, muda para a esquerda. Não é preciso andar a comprar chaimites.

Por: António Matos Godinho

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