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Cine-Teatro da Guarda à venda

Sala fechou portas a 1 de Abril de 87, edifício está devoluto desde então

Vinte e um anos depois de ter fechado as portas, o antigo Cine-Teatro da Guarda está à venda. O edifício é propriedade de Antero Cabral Marques, empresário da construção, que, por enquanto, se escusa a adiantar valores. «Quem estiver interessado, que me contacte», refere apenas. É mais uma oportunidade para recuperar um espaço devoluto em pleno centro da cidade, cujo valor arquitectónico e patrimonial continua vivo na comunidade, embora a construção do TMG tenha acelerado o seu esquecimento.

Não é a primeira vez que o dono tenta vender o imóvel. Em 1997, o negócio andou nas bocas do mundo ou não se vivesse então o afã das eleições autárquicas. Tanto mais que a falta de um equipamento cultural condigno dominava os discursos. Aproveitando a maré, Maria do Carmo Borges, então presidente e candidata socialista, propôs-se comprar o Cine-Teatro por 500 mil contos. As negociações quase resultaram, mas Antero Cabral Marques exigiu o dobro. Foi a última tentativa para que o imóvel integrasse o património municipal. Pelo meio, o edifício foi excluído da primeira fase de criação de uma rede nacional de salas de espectáculos que a Secretaria de Estado da Cultura (SEC) pretendia implementar no nosso país até 2005. A SEC inviabilizou a proposta de aquisição do imóvel que a Câmara tinha apresentado no âmbito do programa “Adaptação e Instalação de Recintos Culturais”. Tudo por causa da falta de alguns elementos, como a avaliação do imóvel e uma cópia do contrato promessa de compra e venda.

Alguns anos depois, o empresário anunciou a intenção de transformar o edifício num centro comercial com mais de 3.600 metros quadrados, escritórios e parque de estacionamento subterrâneo. O projecto era visionário e foi aprovado pela autarquia, mas um quezília judicial entre um antigo arrendatário e a Sociedade Empreendimentos Cine-Teatro da Guarda voltou a travar tudo. Apesar disso, a cidade agitou-se com esta eventualidade, 14 anos após o fecho (1 de Abril de 1987) daquela que foi a sua grande sala de entretenimento durante mais de quatro décadas. Na altura, Antero Cabral Marques deixou bem claro que não receava que o projecto não se concretizasse: «Não virá dali nenhum mal ao mundo e o dinheiro que iremos gastar será investido noutras áreas», afirmou, acrescentando que a cidade iria orgulhar-se daquela obra.

Com perto de 7.500 metros quadrados, o novo espaço iria dividir-se em três áreas. A vertente comercial e da restauração rápida era claramente predominante, seguida da zona vocacionada para escritórios e do parque de estacionamento subterrâneo de dois pisos com capacidade para 90 veículos. Para circular em todo este espaço e criar uma «dinâmica de centro comercial», o projectista previu dois lanços de escadas rolantes. «É uma obra a sério e a Guarda tem capacidade para lhe dar vida. Mas é pena que a Câmara Municipal esteja velha e acomodada. Não há, nem nunca houve, uma visão de futuro», afirmou então. Actualmente, o primeiro centro comercial da Guarda, o Vivaci, está a erguer-se a uma centena de metros do Largo de S. João. Na altura, Antero Cabral Marques, gerente da Sociedade de Empreendimentos Cine-Teatro da Guarda, contava investir cerca de 600 mil contos e não tinha dúvidas que o projecto seria facilmente rentabilizado.

Mas garantida estava mesmo a preservação de toda a fachada principal, de forma a funcionar como “imagem de marca” do centro comercial. O imóvel do antigo Cine-Teatro foi projectado pelo arquitecto Manuel Alijó no final dos anos 40 e deixou a cidade da Guarda orgulhosa do «novo edifício, construído em granito da região» e inaugurado a 4 de Julho de 1953. O Cine-Teatro da Guarda viveu de tudo, mas não sobreviveu às exigências do mercado, às mudanças sociais e até às promessas eleitorais. Na campanha autárquica de 97, Maria do Carmo Borges fez da sua aquisição um “cavalo de batalha”. Mas a compra ficou pelo caminho. Curiosamente, o interesse da autarquia nunca chegou para encetar esforços no sentido da sua classificação como edifício de interesse municipal ou concelhio.

Luis Martins

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