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Cavaco e o marques-mendismo

Theatrum Mundi

Suponho que seja pouco cómodo para Cavaco Silva que, pelo segundo congresso consecutivo, o PSD faça questão de lembrar ao seu antigo timoneiro que deposita nele todas as esperanças para uma vitória nas presidenciais. Marques Mendes, o novíssimo príncipe social-democrata, acaba de o dizer. Nunca como agora o PSD esteve em condições de fazer eleger um presidente da república da sua área política: assim apareça o candidato e manifeste a sua presidenciável intenção. Mas qual é verdadeiramente a área política do PSD? Ou dizendo melhor, qual é a área política que o ideário e a estratégia do marques-mendismo querem agora colar ao símbolo do partido? Os sinais dados até ao momento demonstram que se trata do pragmatismo. O pragmatismo das maiorias absolutas, está bem de ver; o pragmatismo que permite ganhar votos à direita e à esquerda; o pragmatismo da tradição cavaquista e da revolução sociológica que conduziu o PSD dos anos 1980 a seduzir o eleitorado mesmo no Alentejo comunista. Enfim, o pragmatismo de um partido ideológica e esteticamente liberal mas que sabe que não pode dispensar a social-democracia do seu nominativo. Em completa contradição, aliás, com o que é a sua filiação europeia e internacional… É este pragmatismo que Marques Mendes pretende recuperar para revitalizar o PSD. E se não for possível já nas autárquicas – que o estado de graça de Sócrates promete durar –, há de haver presidenciais e com elas o regresso anunciado de Cavaco: para restaurar o optimismo da militância PSD e dar uma nova vitória à sua área política.

A estratégia de Marques Mendes, e a sua sobrevivência política à frente de um partido com o horizonte de quatro longos anos de oposição, dependem pois de que Cavaco se torne presidente da república e de que essa maioria possa servir de base sociológica para futuros combates. Sem esse balão de oxigénio, Marques Mendes teme o efémero dos dirigentes condenados às travessias do deserto político e, o que é mais grave, condenados a não lhe sobreviverem. Teme não ser mais que o que Constâncio e Sampaio foram para o PS. Daí também a crítica constante à deriva neoliberal e populista do governo de Santana e o imperativo de recuperar a equívoca social-democracia, isto é, o terreno político do grande centro – o centrão, como já vai sendo conhecido. No fim de contas, não foi aí que Sócrates alcançou a maioria? E que o carisma não abunde, não parece preocupar Marques Mendes, apostado em relembrar que os socialistas estão condenados a repetir os velhos erros do guterrismo e a esgotar ainda mais depressa a confiança há pouco depositada pelo eleitorado. Ainda que o não diga expressamente, e tal qual Durão Barroso a seu tempo, também Marques Mendes confia chegar a primeiro-ministro. Contudo, e ao contrário do de Durão Barroso, o seu horizonte político é mais previsível e corresponde a uma legislatura completa. Mas por muito paciente e hábil que seja, precisa sempre de Cavaco em Belém. Eis que a provável saída de cena de Guterres não poderia chegar em pior hora…

Por: Marcos Farias Ferreira

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