Todas as cartas de humor são ridículas.
(Fernandel Pessoal)
Nas últimas semanas, fui várias vezes interpelado na rua a propósito dos meus artigos n’O Interior. Tenho ouvido coisas como “Tira o carro da frente, ó palhaço!”, “Importa-se de estar um bocadinho calado, que já me dói a cabeça?” ou “Foste tu o modelo do Shrek?”. Embora à primeira vista estas simpáticas intervenções nada pareçam ter a ver com os textos, eu entendo que as pessoas têm reservas de falar das suas leituras e dos locais onde o fazem e por isso utilizam esta espécie de subtexto. Outros há que falam expressamente do assunto. No passado fim-de-semana, por exemplo, obtive esta reacção: “Vi a sua fotografia no jornal. Curioso, pensei que fosse na necrologia.”
Muitos leitores de textos humorísticos costumam ficar intrigados com a origem da imaginação do autor. Pelo contrário, os leitores desta coluna estão apenas intrigados com o que é um ornitorrinco. Outros vivem perplexos com a pretensão da direcção do jornal em contar com colaboradores divertidos e no entanto prolongarem a minha permanência nas suas páginas. A verdade, que o público não conhece, é que eu não escrevo só neste jornal. Também o leio.
Vejamos então de onde vem a imaginação. Pessoalmente, tenho duas fontes inesgotáveis. Uma é a leitura, outra é o Bloco de Esquerda. Quando me sinto despojado de ideias, percorro aleatoriamente textos de Woody Allen e piadas de Francisco Louçã. Além disso, é importante estar atento às notícias e tentar ver o lado divertido das situações. Excepto os debates das presidenciais, todos os assuntos têm um lado chistoso. E há casos como os de Jô Soares, que tem 250 lados e todos são cómicos.
Uma regra básica é esta: um texto humorístico deve ter piada. A não ser que sirva apenas para embrulhar peixe. Nessa circunstância, o texto não precisa de ter piada, mas sim estar de impresso com tinta não tóxica. E piada é algo que é possível aprender a ter. Há vários livros que ensinam a fazer rir e todos referem uma característica importante para o conseguir: nunca ter estudado (e percebido) Contabilidade Analítica.
Escrever é outra tarefa absolutamente simples. Os iniciados podem começar por deixar correr os dedos sobre o teclado e escrever o que lhes vier à cabeça, como ksihwbe oihw ughuyg yuga erts ou parágrafos de Paulo Coelho. No entanto, é aconselhável que após algum tempo se passe a escrever palavras e orações com sentido. Escrever humor torna-se assim uma tarefa facilitada. Basta ter uma ideia cómica, um sítio para escrever e conhecer todas as letras do alfabeto. Se duvidar da sua própria graça, experimente este teste. Mostre as suas obras satíricas à sua sogra. Certifique-se que ela desconhece a sua conta bancária, sabe pouco sobre a sua profissão e não faz ideia de quem sejam os seus amigos. Caso contrário, ela pode estar a rir-se de si e não dos seus escritos.
Vejamos agora alguns truques para fazer belas chalaças. Pode exagerar-se a realidade. Veja-se este exemplo: “Sou tão mau na cama que as mulheres nem dão conta que já saí para me lavar.” O leitor interessado perceberá o exagero, pois sabe que muitos homens não se vão lavar depois. O inesperado tem sempre um resultado cómico. É por isso que as pessoas se riem quando alguém tropeça nas escadas ou os sistemas operativos da Microsoft funcionam sem falhas. Outra fórmula para ter graça é o jogo de palavras. Há duas maneiras de fazer isto: conhecer bem todo o vocabulário da língua portuguesa ou copiar dos álbuns mais antigos dos GNR. Finalmente, um dos melhores recursos estilísticos para escrever humor é utilizar a ironia, que é dizer o contrário do que se pensa. Um pouco como José Sócrates quando diz que deseja a eleição de Mário Soares para Presidente.
Por: Nuno Amaral Jerónimo