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Capital Europeia da Cultura

Em 1985 a União Europeia instituiu a Cidade Europeia da Cultura – uma cidade por ano passou a ser escolhida para mostrar a sua dimensão cultural, a sua criação e a sua comensuração europeia. Atenas foi a primeira eleita, seguindo-se-lhe Florença e depois Amsterdão… Em 1999 mudou a designação para Capital Europeia da Cultura e, a partir desse ano, passaram a ser nomeadas duas cidades, de diferentes países, com o objetivo de «acentuar a riqueza e diversidade de culturas na Europa, celebrar as marcas culturais partilhadas pelos europeus, aumentar nos cidadãos o sentido de pertença a um espaço cultural comum e fomentar o contributo da cultura para o desenvolvimento citadino». Em 1994 foi Lisboa a Cidade Europeia da Cultura; em 2001 a Capital Europeia da Cultura foi o Porto (e Roterdão, na Holanda) e em 2012 foi Guimarães (e Maribor, na Eslovénia).

33 anos depois é evidente que as capitais da cultura cresceram culturalmente, mas também económica e socialmente. A capitalidade deu-lhes afirmação e universalidade e foi uma alavanca na regeneração urbana. As três cidades portuguesas nomeadas foram marcadas de forma indelével por essa capitalidade. Lisboa recuperou a diversidade cultural e afirmou-se definitivamente como uma cidade cosmopolita, moderna e europeia; do Porto 2001 ficou a Casa da Música, mas também a requalificação urbana; de Guimarães 2012 ficou a Plataforma das Artes e da Criatividade e a regeneração do centro histórico. A escolha da cidade portuguesa que em 2027 irá receber as insígnias de capital europeia (juntamente com uma cidade da Letónia) será uma longa corrida, com muitos candidatos com bons argumentos e ideias para cativar o comité internacional de especialistas em 2023. Viana do Castelo, Braga, Aveiro, Coimbra, Viseu, Guarda, Leiria, Caldas da Rainha (candidatura conjunta de cidades e vilas do Oeste), Oeiras, Cascais, Évora e Faro são as cidades que levantaram o caderno de encargos e pretendem assumir a organização. Algumas estão já numa fase avançada de planificação da candidatura. Como Aveiro ou Évora que potencializam a internacionalização da candidatura, enquanto Leiria aposta na experiência de João Bonifácio Serra, que esteve à frente da Guimarães 2012. Outras, como Coimbra, que escolheu Luís de Matos para coordenar a candidatura, um ilusionista a quem não é conhecida qualquer ideia sobre cultura, trilham o caminho inverso aos pressupostos de Capital Europeia da Cultura – lastimável.

Mas é a candidatura da Guarda que aqui nos preocupa. José Amaral Lopes, ex-secretário de Estado da Cultura, foi o escolhido para coordenar a candidatura. O envolvimento das pessoas, dos diferentes agentes e instituições da cidade e região podem, e devem, ser um dos vetores de afirmação da candidatura. Também a ligação a Salamanca deve ser exponenciada e referência na «dimensão europeia» da candidatura.

Como aqui escrevi em maio, «A Guarda é uma pequena cidade, mas uma cidade aberta, transfronteiriça e virada para a Europa». Por isso, e ao contrário de do que alguns “convidados” da autarquia guardense têm dito em sessões de promoção e debate da candidatura, não será pela ruralidade, pelas tradições, cultura popular ou especificidades endógenas, mas, pelo contrário, e como está definido nos objetivos do conceito de capital europeia, será pela diversidade, universalismo, pela vida cultural da cidade e a sua identidade, os seus equipamentos, o património construído, a história e a capacidade de agregar a região – a capitalidade será uma (re)conquista onde terão de caber os Patrimónios da Humanidade do Alto Douro Vinhateiro e do Vale do Côa (e o Museu do Côa, um equipamento de referência), a natureza entre a Serra da Estrela, a Malcata e a Marofa, a UBI enquanto academia que se afirma internacionalmente e poderá ser o centro de estudos de excelência para a região e a capacidade de criar e promover as artes, as letras e a animação cultural na cidade. Os preceitos para a escolha são, nomeadamente, «a dimensão europeia do projeto, o conteúdo cultural e artístico, o impacto» e a estratégia de longo prazo. É no longo prazo que urge apostar, pelo presente e pelo futuro da Guarda.

Luis Baptista-Martins

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