No último ano fui multado três vezes. Numa o radar caçou-me a 70 à hora entre a rotunda do novo quartel dos bombeiros e o cruzamento do caminho para o Tintinolho. Sozinho num troço pouco frequentado da avenida, por volta do meio-dia, bem fez a polícia – dissimulada estrategicamente no acesso à antiga lixeira – em apanhar-me. Embalado nos 20 quilómetros acima do limite, sabe-se lá que loucura cometeria quando atingisse o centro da cidade. Paguei os cinquenta euros. Mas senti-me um tanso. De modo que, na ocasião seguinte, quando fui surpreendido ao entardecer por um flash numa recta da deserta VICEG, ouvi um agente comunicar-me que me tinham colhido a 105 num limite de 80 e, sem protesto, cumpri os costumes. Mas não levantei o aviso de recepção que passado um mês a PSP me enviou e devolvi a «notificação por via simples» que se lhe seguiu. Aguardo a chamada do Tribunal para ser julgado por, alegadamente, constituir um perigo para a segurança rodoviária. É provável que perca e pague (objectivamente cometi uma infracção por não observar a velocidade sinalizada e não declino a culpa) mas terei, pelo menos, o meu momento de catarse: irei discutir a imbecilidade de um limite de 80 quilómetros por hora numa via de quatro faixas que ninguém usa (porque nada foi regulamentado para desviar o trânsito dos acessos convencionais à cidade, nem sequer a proibição dos pesados) e a grosseria de um corpo policial que julga cumprir a missão de segurança pública pespegando-se à caça nos locais de previsível transgressão. A terceira multa, recente, é por estacionamento indevido em local pago. Em apenas seis minutos – o atraso entre a hora limite impressa no talão do parquímetro e o meu regresso – houve um zeloso agente da ordem pública que conseguiu preencher o papel da multa, afixá-lo no sítio e desaparecer de maneira a que eu, na volta que ainda dei pelas redondezas para tirar satisfações, já o não localizasse. Também vou deixar o caso seguir até ao relaxe. Faço questão de ser constituído arguido para olhar nos olhos o espécime que realizou o serviço. Grande parte da tarefa visível da polícia, por estas bandas, resume-se a isto: caça descarada à multa; operações stop idiotas em rotundas e cruzamentos dentro da cidade; vigia às portas dos infantários, nas horas de entrada e saída das crianças, para exibir autoridade e chatear quem não tem outro remédio senão infringir a sinalização. Numa cidade com acessos desorganizados e falta de estacionamentos, não há uma atitude de prevenção, sensibilização, amenidade, orientação ou ajuda. Não existe um sentido cívico da função – insiste-se na insolência como imagem de marca e na coibição como objectivo supremo. Há excepções? Certamente que as há, sobretudo entre os agentes mais jovens, com melhor formação e menor ascendente castrense. Mas só vêm confirmar a regra.
Por: Rui Isidro