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As contas do nosso desconsolo

Editorial

1. A publicação do Anuário Financeiro dos Municípios para 2015 permite uma perceção pormenorizada do estado das contas das câmaras municipais no ano passado. A menos de um ano das eleições autárquicas, considerámos os indicadores mais relevantes e que são o retrato da realidade financeira de cada um dos concelhos. Num país ainda angustiado com a crise e a austeridade, os dados apresentados no Anuário permitem não apenas conhecer o estado das contas, mas também perceber o caminho percorrido, as câmaras que têm arrecadado mais impostos ou aquelas que mais aliviaram a fatura aos contribuintes; ou as câmaras que estando endividadas continuaram o regabofe e contratam trabalhadores para agradar às clientelas, enquanto o cidadão e as empresas vão sendo asfixiados com tanto imposto, taxas e taxinhas.

2. Entre os diferentes indicadores, um dos que mais interessa ao leitor é o valor da coleta de IMI e IMT. Ou seja, quanto é que a Câmara Municipal arrecada com impostos aos proprietários de uma casa ou quanto recebe pelas casas que se vendem no concelho. E aqui temos a primeira grande surpresa: o município da Guarda é o que arrecada mais dinheiro de IMI em todo o interior do país – sete milhões e trezentos mil euros (7.299,288€), muito acima dos 6.293,374 cobrados pela autarquia de Castelo Branco, mais do que o que arrecadou a Câmara da Covilhã (5.395,294€), e mais do que Vila Real (5.860,734€), Portalegre (3.232,870€) ou Bragança (4.481,060€) e nem vale a pena falar dos demais concelhos da região… Recordar que em 2013 a taxa de IMI era de 0,35, ou seja, quem tinha uma casa de 100 mil euros pagava 350 euros de IMI por ano, Álvaro Amaro promoveu o aumento para 0,45, com o argumento falacioso de que o município tinha uma dívida estratosférica de mais de 90 milhões!!! (ao somar passivo exigível, com compromissos e intenções e vontades de despesa…). A dívida em 2015, afinal, ficou em 30.816,295€ e Álvaro Amaro, com mérito e habilidade política (e perante a inépcia da oposição), verberou que podia baixar o IMI em 2017 (ano de eleições)… para 0,40 (devia era ter reposto a taxa que herdou de 0,35). Assim, a tal casa de 100 mil euros irá pagar 400 euros quando devia pagar 350 euros. E os cofres da Guarda continuarão a estar cheios enquanto os guardenses vão sendo extorquidos – recordar que a generalidade das isenções de IMI atribuída à maioria das casa, no boom de construção na Guarda até 2008, e em que os compradores ficaram isentos entre seis a 10 anos, terminaram em 2014.

Pelo contrário, na comparação com os mesmos concelhos, a Guarda é o que cobra menos de IMT: 666,857€ – a Covilhã 735,422€; Castelo Branco 1,371,725€; Vila Real 996,675€; Portalegre (740,766€) e pouco mais do que Bragança (629,483€). Ou seja, a falta de dinamismo económico leva a que a Guarda seja, destes concelhos, o que tem menos dinâmica e menos negócio imobiliário. Mas, de acordo com o Anuário, a Guarda é também dos concelhos que mais gasta com pessoal e dos que deixa menos dinheiro disponível para investimento. Como diria o anterior primeiro-ministro: a Guarda está melhor (mais popular), os guardenses pagam milhões de IMI, pagam a água ao preço do ouro, e andam todos muito contentes com a «vida airada».

Luis Baptista-Martins

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