P – Quais as suas opções estratégicas para este mandato?
R – De uma forma geral, o problema da infra-estruturação do concelho está praticamente ultrapassado. Neste momento, as nossas grandes preocupações vão no sentido de procurarmos dotar o concelho de um conjunto de equipamentos que possam ser um valor acrescentado para o seu desenvolvimento. Neste contexto, os eixos ligados ao desenvolvimento foram previamente estabelecidos. Não diria que é uma política de continuidade porque até a própria contextualização do momento económico que o país vive nos obriga a que algumas situações mereçam reprogramação. É evidente que as nossas preocupações têm sido direccionadas para um conjunto de condicionalismos muito próprios deste concelho e das regiões do interior do nosso país, que se prendem com o despovoamento e o envelhecimento da população. O antídoto para esta situação é só um e tem a ver com emprego.
P – Nesse contexto, qual é a estratégia para compensar o desaparecimento da indústria têxtil no concelho?
R – Nem todos os concelhos reagiram da mesma forma ao problema do têxtil. O têxtil constituiu problema porque vivíamos numa situação de mono-indústria e o encerramento de um leque diversificado de empresas levou a que a população reagisse de forma diferente a essa problemática. A década de 90 foi muito difícil para todos e em particular para quem vivia do têxtil, mas ou criando o seu próprio emprego ou migrando para outras regiões do país ou para o exterior, as pessoas conseguiram ultrapassar sem que houvesse grande conflito sob o ponto de vista social. O que é certo é que tudo é mais difícil em regiões como a nossa. Temos também um leque de problemas que lhe estão associados como o envelhecimento da população e o despovoamento e a partida das pessoas porque não lhes conseguimos dar emprego. Agora, temos também perfeita consciência de que fazer a mesma coisa aqui custa muito mais dinheiro. Somos penalizados por vivermos nesta região.
P – Acredita mesmo que a Concessão da Serra da Estrela se vai concretizar nesta legislatura?
R – Esse é um problema novo com que nos confrontámos já no início do nosso mandato. É uma luta antiga que tem cerca de três décadas e um desejo que queríamos ver concretizado tão perto quanto possível. Até pelos próprios enquadramentos que o Governo foi dando a esta questão tudo levava a crer que esta situação, em meados deste ano, poderia assumir o carácter de concretização. Sou uma pessoa optimista e acredito nas pessoas, porque se não for assim, temos grandes dificuldades em atingir os nossos objectivos. Ao olharmos para o mapa rodoviário nacional verificamos que há no meio deste coração do interior uma região enferma de falta de estradas e não estou a falar em auto-estradas. Estou a falar em estradas que ligam vilas e cidades do interior, que congregam, pelo menos, quatro distritos, Coimbra, Viseu, Castelo Branco e Guarda e a existência destas estradas é fundamental no contexto do desenvolvimento económico desta região. Sabemos que o que está em causa é a disponibilidade financeira para que estas obras se possam assumir de imediato como a prioridade das prioridades. Até porque isto é feito em nome da coesão, entendida de uma forma tão ampla quanto possível, não só no sentido territorial, mas também no sentido ambiental e social. Não somos cidadãos de segunda e levaremos as nossas intenções até às últimas consequências.
P – Mas entretanto, Seia está de certa forma isolada, na medida em que não consegue ter uma porta directa para as auto-estradas que são essenciais para o desenvolvimento?
R – É um facto indesmentível neste momento e temos duas formas de reagir. Ou perante esta adversidade cruzarmos os braços e esperarmos que o nosso tempo surja ou continuarmos a luta. Nos últimos tempos temos assistido a um movimento que consolida cerca de 25 Câmaras dos quatro distritos e que independentemente da cor política que está subjacente aos eleitos todos têm confluído no mesmo sentido. É evidente que não têm de todo o mesmo pensar sobre os traçados, mas no que diz respeito à sua existência estão todos conscientes de que sem eles, o futuro não será risonho para nenhum de nós. O problema do subdesenvolvimento não é só dos subdesenvolvidos, é também dos desenvolvidos sob pena de não haver futuro para nenhuma das partes.
P – Como é que vê a estrada de ligação directa de Seia à Serra?
R – Houve uma intervenção que ainda não aconteceu no todo entre Seia e perto da Covilhã. Está a decorrer, tem havido alargamento e criação de espaços de viragem. É uma intervenção essencial que melhorou em muito o acesso à Serra. Seia tem sido de há muitos anos a esta parte tida como a porta de entrada principal para a Serra da Estrela. Por estranho que possa parecer, com a criação das A23 e A25, os fluxos alteraram-se relativamente à fluidez de trânsito para a Serra por esta via, porque as pessoas que são oriundas do Sul preferem o acesso pela A23 e muita gente oriunda do Norte prefere continuar pela A25 e sair na Guarda, ir até à Covilhã e subir a Serra. Portanto, Seia tem perdido um fluxo de trânsito por essa via. Ou seja, as tais auto-estradas, que teoricamente traziam e podem trazer mais fluxo à Serra, não vieram beneficiar o miolo da Serra. Por isso é que mais uma vez reforço que queremos estradas que nos levem tão rapidamente quanto possível às tais auto-estradas e os IC’s que reivindicamos possibilitam essa opção. No entanto, a questão da Serra e da própria permanência de pessoas não é só explicada por via da A23 e da A25 na minha modesta opinião. A questão da Guarda e da própria Covilhã com a construção de novos hotéis possibilitaram uma capacidade de atractividade maior que antes não tinham e que logicamente penalizou o outro lado da Serra.
P – Seia tem um problema de capacidade de alojamento?
R – Temos problemas de capacidade de alojamento e há uma questão que não devemos ignorar. O turismo da Serra da Estrela foi durante muitos anos vendido de uma forma incorrecta. A Serra não deve vender só e exclusivamente as suas potencialidades num contexto de turismo de Inverno. Deve evoluir para outras formas, entre as quais o chamado turismo de natureza. A Serra tem todas as potencialidades de poder vender durante 12 meses no ano e mesmo as capacidades de alojamento que hoje existem estão minoradas relativamente à potencialização que o próprio turismo pode trazer para esse nicho da economia local. Conseguirmos aqui criar um conjunto de roteiros locais para aqueles que nos visitam, que podem dar ocupação durante três, quatro dias, para além das potencialidades que a Serra oferece sob o ponto de vista da natureza, e isso acontece com o Centro de Interpretação da Serra da Estrela que é, sem dúvida nenhuma e neste momento, a própria jóia da coroa em termos do município. Depois temos uma área que se estende desde o Museu do Brinquedo aos museus etnográficos que estão associados aos Ranchos Folclóricos de Seia e de S. Romão ou o Museu da Electricidade. Tínhamos também idealizado para Sandomil o Museu da Agricultura e da Alimentação, mas neste momento, num contexto de parcerias porque a vida está difícil e temos que procurar novas formas de levar as nossas ideias a bom termo, não iremos ter esse Museu, mas há toda a possibilidade de termos um Museu da Água por uma parceria que estamos a estudar.
P – O Museu do Pão tem contribuído também para a atracção de pessoas?
R – O Museu do Pão é hoje uma referência para Seia. É um projecto-âncora e um bom exemplo do que pode e deve ser feito se calhar em todas as regiões do país. Pela sua singularidade e até pelo sítio onde o Museu nasceu, se calhar a maior parte das pessoas não acreditava num projecto daqueles. É um investimento que foi feito em boa altura e em tempo oportuno felizmente no nosso concelho.
P – Em termos de Turismo. Seia não pode vir a intervir na polémica entre a Covilhã e a Turismo Serra da Estrela e reivindicar a sede da instituição?
R – Esse é um problema que diz respeito à TSE e à cidade da Covilhã. É uma polémica onde não me quero imiscuir porque não contribuímos para ela. Tomámos a posição que achámos por mais conveniente quando esta questão se colocou e estamos a seguir o nosso caminho. Ainda há pouco tive a ocasião de falar com o responsável pela TSE e estamos numa colaboração forte relativamente aos interesses da TSE. Estou a falar em concreto da Aldeia do Sabugueiro, onde temos um problema que queremos resolver em colaboração, quer com a Junta de Freguesia, a TSE, quer as pessoas que lá vivem, que passa por um conjunto de alojamentos diversificados que nesta altura do ano albergam pessoas, mas que não estão legalizados. Temos ali um número de camas que pode multiplicar sob o ponto de vista legal as camas existentes no concelho porque isto reflecte-se no contexto de verbas que são atribuídas por via do Orçamento de Estado. É um problema que queremos resolver e sabemos que só o poderemos fazer se trabalharmos em conjunto.
P – Não receia o impacto que o excesso de endividamento vai ter na gestão do município nos próximos tempos?
R – A situação do excesso de endividamento é o resultado de duas situações. A primeira tem a ver com a própria fórmula que sob o ponto de vista legal é colocada aos municípios. Somos 308 Câmaras no país com realidades muito diferentes e a lei é a mesma para todos. Há excesso de endividamento e nestas circunstâncias o município terá que abraçar as consequências desta situação. O que tenho a dizer é que com certeza o futuro será difícil relativamente ao cumprimento dos objectivos que, já numa situação normal, não seriam fáceis de atingir e tende a agudizar-se com esta questão. Isto aconteceu porque muitas vezes para se fazer o que se fez teve que ser com acesso a dinheiros oriundos de empréstimos. Isso, por um lado, concretizou-se em termos de obra e, por outro, a nova lei das finanças locais veio alterar a meio do campeonato as regras do jogo. E isto logicamente para municípios que tinham níveis de endividamento já significativo não lhes tornou a vida fácil a partir daí. Há preocupação como é óbvio e no momento em que isto aconteceu é a de tentar pela forma que tenderei a explicar nos órgãos próprios qual será o trilho a seguir. Agora é evidente que temos os nossos objectivos traçados e com mais ou menos dificuldades, com mais ou menos parcerias queremos tornar consequentes as ideias que apresentámos.
P – O concelho de Seia é o segundo mais populoso do distrito da Guarda, mas essa importância não parece muito notória. Seia está de costas voltadas para o distrito?
R – O que se tem passado é que as relações com a Guarda enquanto distrito e sede distrital têm sido um pouco problemáticas e vêm um pouco da forma de estar dos diferentes autarcas. São conceitos até da forma de gerir e de estar dos próprios autarcas, já que na maioria dos casos havia um pensar muito no próprio concelho em si como se o território não fosse constituído por outras partes. Quero dizer que não tenho uma visão dessa forma relativamente à relação entre estas partes do território. Até a própria lei no que diz respeito à questão de projectos coloca muito mais o enfoque nos projectos supramunicipais e isso tem alguma lógica porque o esvaziamento que estamos a sentir no interior do país significará que não poderemos estar a construir em espaços muito próximos equipamentos concorrentes porque não são rentabilizados. Por isso mesmo esta obrigatoriedade que nos foi colocada por via de procurarmos junto até dos dinheiros do QREN a forma de financiarmos esses projectos tem lógica. E isto não pode, nem deve ficar só estritamente contextualizado em relação aos fundos comunitários. Tem que ir muito para além disso. Confesso que há coisas que tenho muita dificuldade em compreender. Por exemplo, os PDM’s, quando os territórios são fronteiros uns dos outros, nós elaborarmos PDM’s sem conversarmos praticamente uns com os outros.
P – Vai fazer um mandato de continuidade na linha de Eduardo Brito ou pretende iniciar um novo ciclo?
R – Penso que se iniciou um novo ciclo. Trabalhei com Eduardo Brito, somos amigos, mantemos as relações que tínhamos, partilhamos muitos interesses em comum, mas apesar de sermos muito próximos temos feitios e formas de estar e de enfrentar os problemas muito diferentes. Eu era vice-presidente no anterior executivo e costumava dizer que era por esta diversidade sobre o concelho que tínhamos a virtude de nos complementarmos e de que houvesse um pouco mais de simbiose sobre os interesses do concelho. Tenho uma equipa diferente porque o Eduardo, por vontade própria, achou por conveniente afastar-se. Poderia ter feito outro mandato e estou crente de que se fosse candidato teria ganho à mesma a Câmara. Esta decisão foi partilhada entre os dois e achámos por conveniente que deveria ser assim. Olhando para o meu passado, nunca pensei ser presidente de Câmara e da minha terra que me deixa como é óbvio muito gratificado perante aqueles que me elegeram.
P – Em matéria de saúde. O Hospital de Seia é o que os senenses merecem ou deveria haver algo mais?
R – Nunca estamos contentes com o que temos. Houve uma primeira grande conquista que foi existir sob o ponto de vista físico o que aconteceu em termos de ULS e esta situação foi de uma responsabilidade grande por toda a perturbação e de algum paralelismo que existiu nessa altura relativamente à questão das estradas de hoje. Compreendemos que o hospital não está localizado no melhor sítio possível, mas na altura se trouxéssemos à ribalta mais uma discussão de que se era ali ou noutro lado tenho a certeza que não tinha nascido nem ali, nem noutro lado. É uma obra excepcional sob o ponto de vista físico, tal como a qualidade daqueles que lá trabalham porque os resultados obtidos mesmo nas condições que tinham eram irrefutáveis no contexto nacional. Por isso, era nossa preocupação que o conjunto de valências que na altura existiam não baixasse com esta transformação. Isso não aconteceu, antes pelo contrário. Já em termos de gestão, hoje a ULS é liderada por um Conselho de Administração que está sedeado na Guarda e isso sob o ponto de vista local traz-nos alguns amargos de boca. Acho que devia haver uma presença maior do CA relativamente à ULS de Seia no sentido de que quem ali trabalha pudesse sentir mais de perto que a liderança está presente ou representada. Nessa circunstância tenho o compromisso por parte do CA de que vão passar a reunir uma vez por mês em Seia.
P – Que obra ou marca gostaria de poder realizar neste mandato?
R – Confesso que a obra física não me apaixona. Não vivo obcecado com a ideia de que quando eu sair que fique o Museu “A” ou a estrada “B” ou outro equipamento qualquer como aquilo que as pessoas achem que seja o mais conveniente para relembrarem a minha pessoa em termos de obra. Sou mais um apaixonado das coisas imateriais. Uma das situações que primeiramente me preocupou foi a de aproximar mais a governança dos cidadãos. Uma coisa que cultivo é a relação que coloco com os cidadãos desta terra. Outra coisa que também queria deixar como marca é da própria relação das pessoas com o meio envolvente. As questões ambientais são para mim muito caras. A questão do estancar a saída das pessoas e ainda gerar atractividade, sabendo que isso só é possível através de maior criação de riqueza por via da criação de empresas. Essa é a minha preocupação que se consubstancia numa coisa muito simples, que as pessoas daqui a, pelo menos, quatro anos tenham a noção de que o seu bem-estar e a sua qualidade de vida é algo que está um pouco melhor em relação ao que receberam ou daquilo que eu recebi há cerca de seis meses.