Arquivo

“Arrumar a casa”

Crónica Política

Somos um país em que nos habituámos a viver de forma resignada com as nossas limitações enquanto povo e em que a esperança em dias melhores, por norma, não é acompanhada de um esforço concreto e lúcido para almejarmos esse objectivo.

Esta nossa condescendência colectiva, leva-nos entre outros à aceitação de muitas coisas que reconhecemos erradas, sem que elas provoquem em nós uma atitude de viva repulsa.

Face a tal, foi até preciso que o Dr. Mário Soares, há já alguns anos, nos recordasse que temos o direito à indignação.

Vem esta reflexão a propósito dos sucessivos escândalos a que temos assistido e que, com contínua regularidade, a comunicação social nos vai dando conhecimento.

Desde a Casa Pia, passando pelo Freeport, ao BPN, ao BPP, ao apito dourado e a tantos outros a que o esforço da memória tem já dificuldade em recordar, são todos eles a parte mais visível deste fenómeno que de forma continuada assistimos, podendo quase dizer-se que eles fazem parte da normalidade da nossa vida colectiva.

O desenrolar destes diversos casos são encarados como novelas da vida real, com actores importantes e populares, em que o interesse pelo desenrolar da história não é acompanhado pela exigência de aplicação de justiça.

A justificação corrente é que lá fora, em países mais desenvolvidos que o nosso, também se passam histórias idênticas.

Torna-se confrangedor observar a posição de incomodidade com que os principais partidos da esfera governativa encaram estas situações, traduzida em especial no vasto leque de argumentos que colocam à investigação de matérias desta natureza, como sejam o segredo bancário, o segredo judicial e a privacidade, protegendo assim o segredo das traficâncias e o proveito de alguns.

A ética na política tem vindo a ser cada vez mais uma questão de culto de aparências, e a sensação de que “o rei vai nu”, é como tal cada vez maior.

A proximidade de novos actos eleitorais, impõe a elaboração de novos programas políticos, tanto à escala nacional como também local.

É pois este um bom momento para que esses programas apresentem novas propostas e compromissos no que se refere à transparência da governação, ao combate à corrupção e ao modelo de funcionamento dos órgãos judiciais.

Não podemos deixar que este tipo de impunidades vá passando de caso para caso, aceitando-os como normais e assimilando-os como uma nova componente da nossa cultura colectiva.

Portugal é um país pequeno, e se a dimensão, para muitas coisas é uma limitação, outras há em que tal se assume como vantagem.

Sempre ouvi dizer que as casas mais pequenas são mais fáceis de arrumar.

Por: Álvaro Estêvão *

* Deputado eleito pelo CDS-PP na Assembleia Municipal da Guarda

“Arrumar a casa”

Sobre o autor

Leave a Reply