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Antiga mina em Almeida pode acolher Centro Integrado de Resíduos Perigosos

Populações de Malhada Sorda e Nave de Haver alarmadas com eventualidade depois de uma empresa ter abordado projecto com autarcas

O concelho de Almeida pode ser um dos dez candidatos à instalação de um Centro Integrado de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos (CIRVER), sistema idealizado pelo actual Governo para substituir os famigerados projectos de co-incineração em Portugal. Este é o receio das populações das freguesias de Nave de Haver, Malhada Sorda e Freineda, em cuja vizinhança poderá ficar instalada uma unidade do género aproveitando as escombreiras de uma antiga mina, actualmente propriedade de uma empresa denominada Postin. O Governo aprovou na semana passada o regime jurídico que enquadrará esta matéria e espera ver as unidades a funcionar em 2005.

Contudo, o alarme já chegou a Vilar Formoso e a localidades limítrofes do concelho do Sabugal, que também terá integrado o leque de possibilidades apontadas pelo Ministério do Ambiente. Mas terá sido a opção da Quinta das Gatas (Malhada Sorda), numa zona de baixa densidade populacional, que mais atraiu as atenções dos técnicos de uma empresa especializada espanhola, que chegou a reunir em Maio último com os autarcas da zona e representantes da Câmara de Almeida para apresentar o projecto. E até organizou uma visita de estudo em 2 de Julho a uma unidade sediada nas Astúrias. Um autocarro quase cheio, onde terá viajado inclusive o presidente da Assembleia Municipal de Almeida, para ver um sistema integrado de tratamento de resíduos urbanos, hospitalares e industriais, para complementar “in loco” as explicações – pouco convincentes, pelos vistos – do técnico. A palestra acabou mesmo por surtir o efeito contrário, segundo contou a “O Interior” um dos edis presentes, que pediu anonimato, e nem a promessa de muitas contrapartidas em acessibilidades para as respectivas freguesias e a criação de 40 postos de trabalho terá convencido os autarcas, receosos de poderem vir a ser «uma lixeira que vai receber resíduos que mais ninguém quer», refere a mesma fonte. Nessa noite, os presidentes de Junta ficaram a saber que os terrenos argilosos daquela mina possuíam uma capacidade de impermeabilidade «natural» e serviriam «perfeitamente» para o armazenamento em segurança dos resíduos. Mais, foi-lhes ainda dito que o objectivo era ocupar 25 por cento da área mineira até um prazo de exploração de 25 anos.

Ministério garante «alto nível» de protecção da saúde pública e do ambiente

Uma perspectiva impensável para a maioria dos presentes naquele encontro, um dos quais disse a “O Interior” estar disposto a «ir até às últimas consequências» para evitar que o projecto se concretize. «Uns produzem riqueza, outros tratam do lixo, isso não pode ser. Nós não somos o quintal das traseiras de ninguém», criticou o autarca, nada convencido com as explicações do técnico, tanto mais que receia pelos lençóis freáticos existentes na zona, pela Ribeira dos Toirões, «que desagua no Águeda e depois no Douro», avisa. Constata entretanto que nunca mais ouviu falar do projecto, nem voltou a ser abordado ou convidado para mais explicações. Um silêncio que, de resto, parece ter envolvido o assunto desde Junho, quando foi abordado na Assembleia Municipal sem outros resultados que não tenham sido a constatação de que Costa Reis, presidente da Câmara, não estaria a par da pesquisa. É isso que pensa Orlindo Vicente, vereador do PS na autarquia, que continua sem saber o papel do chefe de gabinete neste processo. «Ele esteve com o técnico na primeira reunião e terá sido ele a contactar os presidentes de Junta», diz o vereador da oposição, sublinhando ser «terminantemente contra» este projecto.

«A riqueza paisagística, e tudo o que nos rodeia, tem um potencial turístico, e não estamos dispostos a receber resíduos ou actividades económicas que não sejam conducentes com este potencial. Não há contrapartidas económicas que supram os efeitos nocivos daquela unidade», considera Vicente, que só poderá tolerar que o município esteja disponível para armazenar o lixo produzido no concelho ou na região porque este «é sinónimo de riqueza local». De resto, o vereador já desconfia à partida dos primeiros passos desta iniciativa: «Não nos convencem e até a forma como a empresa a apresentou é suspeita. Por outro lado, nem sequer foi à Assembleia Municipal ou ao executivo», estranha. Até ao fecho desta edição, não foi possível obter a posição da autarquia almeidense sobre esta matéria. O Governo entende que caberá a estas unidades – duas a criar no país – a gestão de diversos lixos tóxicos, nomeadamente as lamas de tratamento de águas residuais, resíduos de hidrocarbonetos e de solventes usados, produtos petrolíferos, tintas e vernizes. Cada um destes centros terá obrigatoriamente uma unidade de classificação dos resíduos, um laboratório, um aterro de resíduos perigosos e unidades de estabilização, de tratamento de resíduos orgânicos, de valorização de embalagens contaminadas, de descontaminação de solos e de tratamento físico-químico. Tudo com a garantia de um «alto nível de protecção da saúde pública e do ambiente». O diploma, aprovado na última quinta-feira, permite ainda que sejam usadas instalações dos candidatos já existentes, desde que licenciadas.

Luis Martins

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