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Animar a cidade…

Anotações

As tradicionais festividades na Guarda em homenagem a São João têm perdido, e sobretudo ao longo das últimas décadas, o brilho e a movimentação de outrora, especialmente em torno da feira que tem aquele santo popular como padroeiro.

Recordemos que, nos finais do século dezanove, esta cidade recebia, muitos dias antes, “grande quantidade de forasteiros”, e não faltavam pelas principais artérias as “costumadas fogueiras com danças e cantos”.

O teatro, os concursos de gado e as touradas constituíam alguns dos pontos de atração do cartaz citadino nesse período de enorme agitação festiva e de muitas transações comerciais.

Nessa época, e como já tivemos o ensejo de escrever nestas colunas, a viagem de comboio até à Guarda era incentivada com significativas reduções nos preços, oportunidade aproveitada por numerosas pessoas que engrossavam a multidão de visitantes espalhados por todos os cantos da cidade.

Este quadro, festivo, comercial e religioso – componente que, obviamente, também não faltava – repetiu-se, com mais ou menos cambiantes, durante largos anos, deixando um inquestionável impacto na vida da Guarda.

A Câmara Municipal, aliás, deliberou, em julho de 1954, solicitar ao Governo a “necessária autorização para considerar como feriado municipal no concelho da Guarda o dia 24 de Junho de cada ano”.

O executivo municipal argumentava que os festejos de São João “desde tempos imemoriais atingem proporções de relevo”, sendo por isso considerado “dia festivo em toda a região”.

Por outro lado, a autarquia guardense aduzia a realização da “importante feira anual de S. João, reputada a de maior expansão e amplitude da região por a ela acorrerem com os seus produtos e gados as populações de toda a região beirã e até transmontana”; as estas razões, acrescentava-se, ainda, a intenção de o dia passar a figurar no período das “futuras Festas da Cidade” da Guarda.

Se é certo que na sociedade hodierna as motivações dos consumidores são de longe bem diferentes, mercê de múltiplos fatores (e hoje com as implicações de crise económica e dos graves constrangimentos financeiros), também é verdade que a Feira de São João – criada em 1255 – poderia ter reconquistado (à semelhança de outras congéneres) uma nova afirmação no contexto regional, se tivessem sido introduzidas as adequadas fórmulas de incremento/promoção e os apoios inerentes a uma realização com estas características.

Claro está que para isso tem de haver uma especial sensibilidade e empenho, uma estratégia adequada, um planeamento atempado, um espaço atrativo e uma eficaz promoção junto dos sectores potencialmente interessados num certame desta natureza.

Nesta Guarda das tradições há, entretanto, que sublinhar a iniciativa de recriar esta feira (partindo das especificidades que detinha nos finais do século XIX e primórdios do seguinte) em pleno centro da cidade.

Este programa, gizado pela Culturguarda, tem alcançado assinalável êxito e constituído um momento de aproximação entre o passado e o presente, proporcionando a muitos dos residentes e visitantes o confronto entre épocas e vivências.

A mencionada atividade – que terá nova edição nos próximos dias 22, 23 e 24 – promovida pela fomenta uma verdadeira e popular animação citadina (conjugada, entretanto, com outras iniciativas marcadas para o próximo fim de semana, como seja a Feira de Jovens Criadores), com todas as vantagens daí resultantes.

A Guarda necessita de ser mais aberta, solidária, moderna, criativa, culta, identificada com a sua história/ património e menos conformista, menos condicionada pelos calendários políticos e eleitorais.

É importante que a participação dos seus habitantes não se fique apenas pela presença nestas iniciativas mas se desenvolva igualmente em patamares onde possa contribuir para o desenvolvimento, para a cooperação, para a qualidade citadina, para a defesa dos reais interesses da Guarda.

Por: Hélder Sequeira

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