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Análise da competitividade de uma indústria – a indústria vinícola portuguesa

Opinião

Actualmente o sector vitivinícola constitui um dos subsectores mais produtivos, da agro-indústria e da agricultura, de maior pujança e vitalidade dentro da União Europeia. Este mostra grande dinamismo e capacidade de adaptação às recentes mudanças de panorama, que afectaram as estruturas de regulamentação do comércio mundial- Uruguay Round-1995.

A União Europeia ocupa o primeiro lugar no ranking mundial dentro do sector vitivinícola, aglutinando 45 por cento da superfície de vinhedo e mais de 70 por cento da produção e consumo de vinho em escala mundial. Os seus concorrentes mais directos, por ordem de importância quanto à produção, são Argentina, Estados Unidos, Chile, o conjunto dos países da Europa Central e Oriental (Bulgária, Hungria, Roménia, a antiga Jugoslávia, a República Checa e Eslováquia), o conjunto da ex–URSS e Austrália.

O senso comum diz-nos que o vinho é dos produtos mais tradicionais em Portugal e dos únicos produtos portugueses com considerável reputação e procura externa. Por outro lado, vários analistas/investigadores, como por exemplo Michael Porter, consideraram ser esta uma das indústrias portuguesas com maior potencial para competir num contexto global, desde que houvesse uma reorientação estratégica do sector em favor das qualidades e com uma forte aposta na sua promoção.

Seria, por outro lado, importante a existência de um “cluster” forte e sólido, condição necessária para que as empresas, nele inseridas, tenham condições que lhes permitam serem mais competitivas.

O mercado do vinho tem acompanhado o progressivo processo de internacionalização/globalização à semelhança de outras produções agrícolas. Uma precisão impõe-se contudo, quando se fala da globalização do sector do vinho. Por um lado, a globalização dos mercados é um facto incontornável que impõe a todos os actores da fileira esforços acrescidos para garantir uma posição competitiva, por outro lado a globalização da produção, é uma realidade bem diferente.

Com efeito, o vinho não é uma mercadoria qualquer, não pode ser produzida em qualquer lugar e deve obedecer a regras bem mais complexas do que a simples minimização dos custos de produção. A localização das vinhas, à semelhança de qualquer outra unidade de produção, está submetida à regra das vantagens comparativas; cada região tem as suas e são bem mais importantes e determinantes da sua imagem e posição no mercado que unicamente os custos de produção.

A redução do consumo de vinho nos países produtores europeus e o crescimento progressivo do consumo de países não produtores, tanto europeus como noutros continentes, com algum destaque para a Ásia, têm constituído um dos factores determinantes do aumento de trocas internacionais. Acresce a este facto o aumento da capacidade produtiva dos chamados países do “novo mundo vitícola” com a contribuição do Hemisfério Sul, essencialmente Chile, África do Sul e Austrália, que com os EUA têm marcado a produção mundial com volumes importantes destinados aos mercados externos.

Este alargamento do mercado tem permitido nos últimos anos compensar a quebra de consumo dos mercados tradicionais, resultantes quer da alteração dos hábitos de vida quer fruto das pressões das campanhas anti-alcoólicas, que centram de forma insistente a sua comunicação em torno do vinho.

No período 1981/85 o mercado mundial do vinho cifrava-se em 49,5 milhões de hectolitros, valor que corresponde à soma dos volumes de exportação.

Após uma ligeira retracção no período 1986/90 temos assistido a um aumento constante desse valor, situando-se em 1998 em torno dos 66 milhões de hectolitros..

Utilizando os dados do consumo mundial como referência a percentagem de consumo de vinhos “não autóctones” (vinhos consumidos fora dos países de produção), subiu de 17,6 por cento, no início do período em análise, para um valor próximo de 30 por cento em 1998.

Se analisarmos a origem das transacções por países exportadores podemos distinguir 3 grandes grupos com comportamentos distintos.

Os cinco principais países exportadores da Europa (França, Espanha, Itália, Alemanha e Portugal) representam actualmente 71 por cento do mercado mundial com 42,9 milhões de hectolitros (média do período 96/98). Comparando com a média de 81/85, constata-se uma perda de 5 por cento no peso relativo do mercado mundial, embora se verifique um aumento em termos absolutos (mais 5,5 milhões de hectolitros).

O segundo grupo de países representa o “novo mundo vitícola” e inclui os principais exportadores: a Argentina, o Chile, a África do Sul, a Austrália e os EUA. Este grupo encontra-se em franca expansão: passa de 2 por cento para 14 por cento na quota relativa do mercado mundial, o que corresponde a multiplicar por 10 o seu volume de exportações (0,7 e 7,2 milhões de hectolitros, respectivamente no início e fim do período).

Em sentido contrário evoluíram as exportações dos PECO (países da Europa Central e Oriental, representados nesta análise pela Bulgária, Hungria e Roménia) e dos países do Magrebe (Argélia, Tunísia e Marrocos). Reduziram o seu volume de exportação de 7,0 para 4,5 milhões de hectolitros no período em análise, o que corresponde a uma quota actual em torno dos 6 por cento contra 14 por cento no quinquénio 81/85.

Portugal foi, em 1997, o quarto maior exportador europeu em volume de exportação e quinto mundial. Os dados de 1998 apontam para uma redução importante dos volumes de exportação, resultado essencialmente de uma situação conjuntural de perda de produção. No início dos anos 70 exportávamos, em média, 2 milhões de hectolitros (5 por cento do mercado mundial), tendo atingido em 1997 o volume de 2,4 (3 por cento do mercado mundial), ritmo de crescimento inferior ao aumento do mercado.

A diversidade e tipicidade dos nossos vinhos são vantagens comparativas significativas para o reforço da nossa quota no mercado internacional. A eficiência da estrutura produtiva é contudo fundamental, mesmo se a nossa competitividade não esteja unicamente centrada nos custos de produção.

Portugal é o país vitícola do mundo que dedica à viticultura a maior percentagem da sua superfície agrícola útil, aproximadamente 9 por cento. Bastará este indicador para pôr em relevo a importância do sector no contexto da agricultura portuguesa. Dois outros dados revelam, contudo, uma fraqueza no campo da eficácia do sistema produtivo: um baixo rendimento por hectare (um dos mais baixos no panorama mundial) e uma variação inter-anual de rendimento muito acentuada.

Existe por conseguinte um importante trabalho de modernização a realizar na nossa viticultura, não obstante os avanços verificados nos últimos anos, que se concretizam contudo a um ritmo insuficiente face aos desafios que o crescimento do mercado mundial nos coloca. Um outro campo de actuação deverá ser o reposicionamento da imagem dos vinhos portugueses, definido com base numa estratégia que permita a melhoria da competitividade da indústria.

Paulo Ramos

Consultor

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