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Algumas Verdades Esquecidas

Quebra-Cabeças

Não é por se ganhar que se é bom. A vitória deveria ser uma consequência natural de jogar bem, não um fim em si mesmo. Uma vitória em que o único mérito foi a sorte é uma vitória desonrosa. Quando se está a ganhar por um a zero, deve procurar-se o segundo golo. E depois o terceiro. Se o nosso adversário joga mal, tem azar, se magoa, o nosso mérito diminui. As grandes vitórias precisam de grandes adversários, a darem o seu melhor contra nós. O azar, como a sorte, mesmo sendo prejudiciais ao mérito, são elementos essenciais no jogo. Toda a preparação tem em vista eliminar a possibilidade de o azar bater à porta, que ele só vem quando convidado. A sorte também se procura: atira-se à baliza, mesmo quando se sabe que a probabilidade é baixa de acertar – se não houver nada de melhor a fazer. As recriminações, as lamentações, as lágrimas, de nada servem a não ser para atrasar o momento da recuperação.

O desporto é espectáculo e deveria ser uma escola de homens e mulheres bons, leais, honestos, honrados. Pensar no desporto apenas como a perseguição de um resultado, esquecer o seu elemento lúdico, é transformá-lo em trabalho (do latim tripalium – instrumento de tortura). Ficar no estádio a ver um mau jogo apenas para conhecer o resultado final é uma forma de masoquismo. Quando se deixa de ter prazer no espectáculo desportivo, é porque já não há espectáculo nem desporto.

Os contratempos são estatisticamente prováveis e deve-se contar com eles. Se uma moeda for ao ar cem vezes, vai cair com a cara para baixo cerca de metade das vezes. Se uma coisa puder correr mal, vai correr mal quase sempre, mesmo que isso seja estatisticamente improvável. Um dos objectivos do desporto é a superação: do adversário, de si mesmo. É fazer sempre melhor. Jogar reconhecendo à partida a superioridade do adversário é abdicar de progredir. Mas defender bem também pode ser uma arte e pode estar na base de um ataque bem sucedido. A cobardia em desporto é a pior das cobardias, uma vez que não há nada de verdadeiramente importante a perder.

Os que são capazes de fazer batota em desporto são os mesmos que se deixam corromper, que se vendem, que burlam. São os mesmos das fortunas suspeitas, do tráfico de influências, da cunha, das facturas falsas. São também os que não sabem ganhar limpo, aqueles que reconhecem a sua incompetência mas não aceitam que a excelência demora a alcançar-se, que a classe tem associada a si a patine do tempo.

O futebol é apenas um jogo, um jogo, um jogo, um jogo.

Por: António Ferreira

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