Cada vez que lemos ou vemos uma reportagem sobre a Grécia ficamos com a ideia de que, obviamente, o destino de bancarrota estava há muito traçado e não podia ser outro: a falência do país. Porquê? Pois, precisamente porque um país onde um trabalhador recebe 15 salários e trabalha 10 meses, onde à quarta-feira os funcionários públicos só trabalham durante a manhã, onde toda a gente vivia sem preocupações sobre o futuro, onde para um canteiro de 50 metros quadrados havia 48 jardineiros e que um ministro tinha 28 motoristas… por tudo isto, era evidente, um dia a casa teria de vir abaixo. E veio. De forma estrepitosa e surpreendente. Para a Moody’s, a Grécia já está abaixo de lixo.
E Portugal? Vivíamos como os gregos? Talvez não. Talvez como o assunto é connosco e até nos diziam que éramos o bom aluno do euro não percebíamos, nem fazíamos por perceber, que vivíamos muito acima das nossas possibilidades e produzíamos cada vez menos. Há muito tempo. E que um dia a casa também teria de vir abaixo. Não de forma tão estridente, porque somos um povo sereno, e impávidos fomos assistindo ao saque do Estado. No Governo, nas administrações públicas, nos governos regionais, nas autarquias… barões e baronetes levam anos a saquear o país. Mas disso ninguém quer saber. Quem quer ganhar dinheiro em Portugal sabe que tem de comer à mesa do Orçamento de Estado, que tem de pagar luvas e distribuir comissões… E quando não for assim, pode fechar portas, porque a débil economia portuguesa não deixa espaço a quem não entrar no jogo. Mas como a administração pública paga mal… é a falência de quem dela depende. O ciclo de dependência sufoca a vida empresarial.
Um dia o regabofe tinha de acabar. Está quase. O país que orgulhosamente construiu dez estádios para o Euro e que as Câmaras querem agora vender, que fez autoestradas por todo o lado, que comprou F16 que vai vender ao Paquistão, que adquiriu submarinos com defeitos, que paga os despautérios de Alberto João Jardim…
O mesmo se passa com o emprego. Mais de 60 por cento dos jovens licenciados têm como expectativa de trabalho arranjar um lugar na função pública. É o professor e o engenheiro, é o médico e o enfermeiro… ninguém pensa em trabalhar ou produzir o que quer que seja, sem ter o chapéu do Estado sobre a cabeça. E depois ainda há os partidos, os dirigentes, os presidentes de câmara e companhia que têm de arranjar emprego aos apaniguados, aos militantes, aos amigos e familiares – tudo na função pública – e não é só em Loures, onde Carlos Teixeira, o socialista que já vai no terceiro mandato na Câmara, empregou a mulher, a filha, dois cunhados e a nora, e acaba de contratar a namorada do filho para «adjunta do gabinete da presidência». Por cá, acontece o mesmo. A Câmara do Sabugal contratou dois filhos do então presidente da autarquia António Morgado para técnicos superiores. Na Mêda, João Mourato empregou o filho na Câmara de que era presidente e o município da Guarda contratou o irmão da vereadora Elsa Fernandes. Outras câmaras contratam para os seus serviços ou para empresas municipais familiares de dirigentes amigos ou de autarcas vizinhos, outros metem “cunhas” ou exigem emprego para este ou aquele familiar… É o sistema que temos, que todos acham normal, porque «também têm direito» (mesmo que essa oportunidade não seja dada a outros que também têm direito…), sobre o qual ninguém se envergonha, que «pode parecer mal», como diz o presidente da Câmara de Loures, mas sabe bem, porque o salário está garantido no final do mês, mesmo que não se faça nada, e as regalias e direitos que outros já perderam aqui ainda existem. Claro que um dia a casa vem abaixo. Mas quem quer saber disso? É mamar da teta enquanto ela deita leite. Para a Moody’s já somos lixo? Mas isso que interessa? Alguém vai preso?
Luis Baptista-Martins
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