P- Até onde está disposto a ir o movimento de cidadãos no caso do corte de árvores no parque municipal?
R- O Movimento em Defesa das Árvores da Guarda irá até onde a sociedade civil exigir. A dinamização de uma página no Facebook com difusão de informação relevante, uma petição com mais de 1.110 subscritores – e que tentámos sem sucesso apresentar na última Assembleia Municipal –, a elaboração de um relatório técnico acerca das árvores a abater e a promoção de uma conferência seguida de debate aberto à população, foram as acções levadas a cabo até hoje. Não posso antecipar as que se seguirão porque tudo depende da posição do executivo camarário. Dada a informalidade e abertura deste grupo a todos quantos dele queiram fazer parte, as acções podem assumir novos contornos, com recurso à justiça ou não, mas sempre com o mesmo objetivo: o da desmistificação, clarificação e preservação de árvores saudáveis. Se haverá alguém acorrentado às árvores, como ocorreu em Madrid com a baronesa Thyssen, perante um projeto de Siza Vieira que pretendia o corte de árvores saudáveis no Paseo del Prado, não sei. Tudo depende do apego dos guardenses ao seu parque. Em Madrid as árvores não foram cortadas.
P- O Presidente da Câmara acusa-os de terem motivos políticos, o que acha desta afirmação?
R- A verdadeira rasteira à Guarda é dada por quem, não tendo argumentos suficientemente fortes para rebater aquilo com que é confrontado, se refugia na mais fácil forma de descredibilização de um protesto, o de que ele tem agenda política. É também um erro porque ao politizar o abate de árvores saudáveis, o executivo perde uma oportunidade clara para revigorar o exercício da cidadania e, consequentemente, da democracia na cidade que o elegeu. Ouvir a população nunca é um erro. Quem esteja minimamente atento à política de gestão arbórea do município nos últimos anos, com cortes e rolamentos injustificados, entenderá que esta luta não é de agora e que este episódio é apenas o corolário desta triste saga sem final aparente. Estive presente na apresentação do projecto do parque e qualquer pessoa que tenha lá estado pode garantir que não existiu discussão. Houve resposta a duas questões, por parte dos arquitectos, um dos quais, incomodado com a pergunta, chamou-me mesmo de “velho do restelo”, ao que se seguiu uma intervenção do presidente da Câmara da Guarda para clarificar que as obras seriam para seguir tal como tinham sido apresentadas.
P- O que pensa da acusação de Álvaro Amaro, que diz que esta ação é contra a requalificação do Parque Municipal?
P- Essa é uma leitura adulterada da realidade. A providência cautelar foi a única forma de lançar o debate para a sociedade, dado que todas as outras formas de comunicação com a autarquia resultaram infrutíferas. As intenções do Movimento em Defesa das Árvores são muito claras e a lei é o que é. Uma providência cautelar só pode ser feita contra um contrato e, não existindo um contrato específico para o abate de árvores saudáveis, a única forma de parar esse abate foi a providência cautelar que teve esse espectro mais alargado. E ainda bem. Porque, e sabemos agora, outros aspectos da intervenção como a aplicação de betonilha, eliminação de taludes, construção de muros e pilares de cimento de grandes dimensões terão um grande impacto ambiental e visual no futuro do parque. Alguém tem conhecimento cabal da descaracterização que será levada por diante com este projecto? Afirmar que somos contra a requalificação do parque é “realpolitik” aplicada aos cidadãos, pois se não posso pronunciar-me acerca da requalificação de um parque a 50 metros do local onde resido não sei que tipo de intervenção me resta que não seja o voto de quatro em quatro anos.
P- Qual a vossa proposta para a requalificação do parque?
R- Gostaríamos que uma mudança tão dramática, que pode descaracterizar um local que tanto diz à cidade do ponto de vista ambiental, sentimental e emocional, fosse debatida com os cidadãos, já que a mesma não constava do programa eleitoral. A proposta do Movimento em Defesa das Árvores da Guarda é muito simples, e possivelmente é isso que incomoda. O atual projeto do parque, da década de 90 e da autoria do arquiteto Nuno Martins, venceu o Grande Prémio Nacional de Arquitetura e a cidade devia orgulhar-se disso. Se o actual estado do parque envergonha alguém não é porque é mau, mas porque não tem a manutenção e investimento adequado. Deveríamos ser exigentes na gestão do espaço público. Um plano simples de valorização do parque, possivelmente não terá o mesmo impacto mediático mas será porventura mais eficaz. A preservação e promoção de monumentos vivos e raros no nosso clima, equipamentos lúdicos para crianças e promoção do desporto, mesas multifuncionais, plano de dinamização, um gradeamento mais nobre, para salvaguarda do vandalismo e fundamentalmente segurança das crianças que o frequentam, promoção de biodiversidade com novas espécies arbóreas e arbustivas, recuperação do habitat dos patos, recuperação do arvoredo com abates de árvores mortas e tratamento das restantes, a aplicação de nutrientes no solo terá um impacto notável na saúde das árvores por um valor ínfimo em relação ao valor adjudicado neste projecto. A vigilância e a manutenção dos equipamentos serão as ações a desenvolver de forma a dignificar o parque. Se a obra tal como está projectada avançar, qual será a garantia de que haverá investimento na sua manutenção? É necessário inverter o paradigma da reabilitação e construção de novos espaços que em pouco tempo se tornam desagradáveis por não existir capacidade de manutenção para todos. Visitem, por exemplo, o Jardim dos Delírios.
P- O que vai fazer o movimento se a providência cautelar for levantada pelo tribunal?
R- Todas as opções se encontram em aberto. Poderemos organizar novas ações informativas, de debate ou mesmo protesto que possam envolver o máximo de cidadãos. Acreditamos que todos os meios são válidos para preservar seres bem mais velhos que qualquer um de nós nesta cidade e que têm um papel extraordinário na promoção da qualidade de vida, mas que depois de abatidos estão irremediavelmente perdidos e o dano dificilmente (e morosamente) é reparado pelas prometidas replantações. Diminuir esta questão pelo número de árvores a abater não faz qualquer sentido. Se estivesse planeado o corte das sequoias do Parque da Saúde, do castanheiro de Guilhafonso e do plátano do Rochoso seriam apenas 62 árvores das milhões existentes no concelho. Faria ainda assim sentido?
Perfil:
Elemento do Movimento em Defesa das Árvores da Guarda
Idade: 35 anos
Profissão: Enfermeiro
Currículo: Licenciado em Enfermagem
Naturalidade: Guarda
Livro preferido: “1984”, George Orwell
Filme preferido: “O Padrinho”, Francis Ford Coppola
Hobbies: Desporto, actividades na natureza
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