A perspectiva do alargamento da União Europeia a Leste tem provocado receios generalizados na opinião pública portuguesa. Os frequentes debates promovidos pelos meios de comunicação social, pelas universidades e pelos poderes políticos têm sublinhado a marginalização de Portugal em benefício de países com perfil semelhante mas que disfrutam das vantagens de uma maior proximidade, geográfica e cultural, relativamente ao motor da integração europeia—a Alemanha.
As ansiedades provocadas pelo alargamento a Leste são reais, mas elas representam, antes de tudo, a dificuldade para um país como Portugal de evitar a sua posição periférica sempre que novos países aderem ao projecto. O mais importante aqui não é o reconhecimento de que a geografia ainda condiciona muitos aspectos das relações entre estados e entre sociedades, nem sequer o reconhecimento de que as sucessivas vagas de alargamento da União Europeia têm importado para a sua estrutura institucional e o seu funcionamento diário a competição entre estados que costuma caracterizar as relações internacionais. Provavelmente, faz falta reconhecer que por muitas vantagens que a integração europeia tenha trazido e venha ainda a trazer, Portugal foi sempre o país menos europeu da Europa e que a sua posição há-de continuar a ser periférica. Se é impossível ignorar as vantagens da integração, também é cada vez mais difícil desmentir a evidência de que ela não produz as mesmas vantagens para todos os intervenientes.
O eixo da União Europeia vai certamente deslocar-se para Leste nos próximos anos. Com ele, e na mesma direcção, vai também deslocar-se a balança de benefícios e a rede de interacções que maximiza esses benefícios. O que aliás é justo e corresponde às proclamações que durante a guerra fria os dirigentes ocidentais não se cansavam de vociferar para o outro lado do muro de Berlim. Não podemos esquecer que a Europa foi sempre por essas paragens e que o Ocidente foi frequentemente apenas uma periferia envolvida em outras andanças. O alargamento da estrutura institucional da União Europeia, que como é sabido não termina em 2004 e há-de estender-se ainda mais a Leste, representa apenas o acertar do passo com a história europeia e com as suas tendências mais profundas.
Tudo isto ficou bem claro na conferência em que participei na semana passada, em Londres, organizada pela Escola de Estudos Eslavos e da Europa de Leste da University College. As vantagens da integração das economias e das sociedades são sempre difusas e produzem o seu próprio passivo. Não admira então que à medida que os benefícios da União Europeia vão sendo distribuídos por maior número de intervenientes, estes procurem diversificar as suas oportunidades e que novos centros e novas periferias venham a ser criados com o processo. O Reino Unido considera fundamental equilibrar a sua opção europeia com a sua vocação americana e em Portugal, os discursos atlantistas já não podem ser confundidos com a rejeição da opção europeia. A vocação brasileira e africana deve estar sempre presente na política externa portuguesa, não só por uma questão de oportunidade económica mas especialmente por uma questão de responsabilidade e de identidade. Seria útil que a cidadania estivesse consciente destes rumos e destas escolhas.
Por: Marcos Farias Ferreira