Água, água, água. Tanta é a água que atravessa e inunda muitos dos filmes recentemente estreados. Seja para afogar pecados, esconder passados, asfixiar desejos ou palco de grandes batalhas, há água por todos os lados em muitos dos filmes que esperam actualmente por nós.
Tudo começou em Outubro, com o intrigante «A Domadora de Baleias», proveniente do outro lado do mundo, onde as ligações ao mar são um dos principais elos de ligação entre as várias lutas por que passam as suas personagens. Mais recentemente, muitas outras obras se servem deste elemento. Seja como ponto de partida, de chegada ou onde tudo se passa.
Para os mais atentos, dizer que Clint Eastwood é um dos maiores valores do cinema americano, em especial na sua qualidade de realizador, não será certamente um choque. Mas mesmo para esses, o seu último filme, «Mystic River» é bem capaz de se revelar uma enorme surpresa. Do realizador de «Unforgiven» esperamos sempre algo de especial, mas não seria justo esperar dele, ou de qualquer outro realizador, um filme que, durante as suas mais de duas horas nunca desce abaixo da perfeição. É assim «Mystic River», filme onde três amigos se reencontram, por culpa do assassínio da filha de um deles. Um dos amigos, raptado e abusado sexualmente, muitos anos antes, é o principal suspeito. Descobrir se é ele o verdadeiro culpado será uma das linhas do filme, mas não a mais importante. Maior importância e relevo tem aqui a capacidade das personagens perdoarem e acreditarem nos outros, com uma constante desilusão e incapacidade de ultrapassar más memórias como companheiras de tormenta. Há vida, emoções e dúvidas a fervilhar em cada gesto, olhar, palavra ou silêncio de cada uma das personagens.
Com Sean Penn, Tim Robbins ou Marcia Gay Harden a representar melhor que nunca, Eastwood assina provavelmente o melhor filme que estreou este ano no nosso país, com momentos e diálogos de antologia que vão, garantidamente, ficar para a história.
Se o filme de Eastwood termina com um corpo nas águas do seu rio (e penso não estar com isto a revelar demasiado do filme), em «Young Adam» o corpo aparece logo no inicio, a boiar, morto, esperando que alguém o apanhe, tal como algumas das personagens do filme, pouco mais vivas que esse corpo. Imaginem um «L’Atalante», de Jean Vigo, sem o amor mas com muito desejo à solta, misturado com pitadas do recente «Spider» de Cronenberg e uns pózinhos de Hitchcock, versão «Wrong Man», e eis o muito interessante «Young Adam», filme oriundo da Escócia com um Ewan McGregor a mostrar que, quando fora de Hollywood, até consegue ser bom actor.
Mas a água continua. Em «Swimming Pool» (na foto), do francês François Ozon, uma escritora de policiais britânica, com crise de meia idade decide partir até França, em busca do sossego que lhe pudesse permitir o reencontro com as palavras. O que esta escritora não sabe é que por vezes a ficção é ultrapassada pela realidade. Ou será antes pela imaginação? Quando uma jovem («escaldante» Ludivine Sagnier filmada com a câmara em brasa), inesperadamente, chega à casa de retiro escolhida pela escritora, tudo muda. E se nos momentos iniciais o filme consegue atingir picos de interesse notáveis, rapidamente perde o controlo e, quando tudo começa a ser permitido, o melhor mesmo é desistir.
Desistir é também o que apetece fazer com «Master and Comander», se tivermos em conta aquilo que nos é prometido. Mas, com expectativas tão baixas, o filme até surpreende, sem no entanto passar de competente. Diverte sem entusiasmar não passando de mais um daqueles filmes que se esquecem ainda antes de sairmos do cinema.
Água e mais água. Até a aventura da Pixar para este Natal, «Finding Nemo», é toda ela na água. Tanta água…
Por: Hugo Sousa
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