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Adegas Cooperativas que futuro?

Carta Aberta ao Senhor Ministro da Agricultura

A situação estrutural e conjuntural do país e a posição que as adegas cooperativas detêm no panorama da agricultura desta região – são seus associados cerca de sete mil viticultores -, exige que nos debrucemos seriamente sobre os grandes desafios futuros que as adegas cooperativas portuguesas têm de enfrentar, relacionados de forma directa ou indirecta com o fenómeno da globalização. A Beira Interior não é excepção e, como tal, as cinco cooperativas não têm, no meu entendimento, sabido evidenciar a qualidade dos seus produtos e não possuem dimensão geográfica e produtiva para enfrentarem, individualmente, o mercado global que é uma realidade que não podemos descurar. Devemos, sim, encontrar formas inovadoras, alternativas à estrutura actual, focadas na racionalização de meios a todos os níveis, para podermos apresentar produtos de qualidade a um preço competitivo quer a nível nacional quer a nível internacional, tendo sempre em atenção que as novas organizações que se criem devem equacionar na base estrutural da pirâmide os produtores viticultores associados das adegas sem os quais não é viável qualquer projecto.

As direcções das adegas da Beira Interior em sede da Unacobi – União das Adegas Cooperativas da Beira Interior – encomendaram um estudo estratégico que denunciasse os pontos fracos, os pontos fortes, as ameaças e oportunidades da região e de cada adega individualmente, a fim de serem tomadas medidas fundamentadas em dados credíveis tendo em vista assegurar a continuação da actividade vitivinícola duma forma sustentada.

Tomando por base os dados constantes no referido estudo e de informação recolhida noutras fontes e da participação em vários seminários e fóruns de debate sobre esta temática, constata-se que:

• O consumo global do vinho encontra-se relativamente estagnado assistindo-se a uma progressiva migração de procura para vinhos de melhor qualidade;

• A posição da Europa na produção e consumo mundial tem vindo a perder peso para os países do “Novo Mundo”, dado que estes têm sido mais eficazes no acompanhamento e influência dos padrões de consumo.

• O cluster do vinho em Portugal apresenta várias debilidades, tendo sido definidas uma série de linhas de orientação globais para a melhoria da competitividade;

• As adegas cooperativas são reconhecidas como uma estrutura de organização de elevada importância económica e social e, como tal, são consideradas um actor chave do processo de melhoria de competitividade nacional; Neste sentido, uma das questões fundamentais que se tem colocado está relacionada com a capacidade de sobrevivência de médio e longo prazo de cerca de uma centena de adegas cooperativas que existem em Portugal, muitas das quais sem qualquer escala ou capacidade de gestão.

O futuro das adegas que constituem a Unacobi passa, necessariamente, pela aposta no conjunto, na concentração de sinergias que, eventualmente, poderá vir a culminar num processo de aglutinação com a entrada de capital de privados. Na plena convicção que esta é uma das vias que se afigura como solução possível enquadrada numa estratégia regional, mantendo a identidade e independência de cada adega, as direcções das adegas de Figueira Castelo Rodrigo, de Vila Franca das Naves e da Covilhã subscreveram um projecto a validar pelas respectivas assembleias-gerais, que consiste basicamente em criar uma organização empresarial que assuma de uma forma profissional a gestão das três adegas, definindo um novo modelo de gestão conjunto, acompanhado de um plano de negócio conjunto contemplando a angariação de financiadores e potenciais investidores.

(…)Face ao enquadramento socioeconómico e político do país e devido à agressividade dos mercados dos vinhos na Europa e no Mundo, tudo se conjuga para que a junção das adegas cooperativas permita criar solidez nas vendas, nos mercados, no sector financeiro e social.

(…)Aqueles que apostam na não aprovação do modelo ora proposto, devem estar conscientes das dificuldades que as adegas passam neste preciso momento e devem apontar soluções alternativas para a consolidação estrutural do sector cooperativo na Beira Interior.

Não basta apresentarem-se nas assembleias-gerais como porta-vozes do saudosismo, invocando os antepassados que fundaram a “sua” cooperativa, esses sim inovadores na forma de gerir nos distantes anos 50, ou com laivos de bairrismo, medo de perderem a sua influência e arautos da desgraça do modelo proposto, mas devem, de uma forma pragmática, apontarem novas vias, novas soluções e acima de tudo estarem disponíveis para liderarem essas mesmas propostas, se algumas vez existirem…

As cooperativas não têm sabido renovar-se enquanto estrutura local, pois na sua maioria a massa critica dos seus actuais associados, não tem como principal rendimento a vinha e apenas se limitam a uma gestão à distância do seu património e a estarem presentes nas assembleias-gerais – quando estão – a lutar para que o pagamento das uvas seja o mais alto e mais rapidamente possível, independentemente da saúde financeira da adega.

Actualmente, apenas o presente imediato é importante. De realçar que na época da fundação do sector cooperativo em Portugal os nossos antepassados souberam distinguir e reconhecer que a união dos viticultores em torno da sua cooperativa lhes criava vantagens. O mesmo deveria ser agora reconhecido com o modelo proposto pela Unacobi às 3 adegas cooperativas (F. C. Rodrigo, V. F. das Naves e Covilhã) para a centralização da gestão das mesmas.

As cooperativas, individualmente, não podem aguentar mais um ano de atraso na implementação do modelo, nem os financiadores vão esperar por mais indecisões dos intervenientes, nem o Governo que encontra nesta solução uma via para a recuperação do sector está disposto a apoiar esta reestruturação, como sempre tem sido manifestado quer pelo senhor Ministro da Agricultura, quer pelo seu Secretário de Estado, e se as cooperativas de Vila Franca das Naves e da Covilhã já deram o seu consentimento a adega de Figueira Castelo Rodrigo, adiou mais uma vez a decisão de aprovar o modelo proposto, concerteza não por falta de informação ou esclarecimentos, mas talvez pela vontade de alguns em deixar tudo como está, como forma de não perderem a sua pequena capacidade de intervenção e alguma visibilidade que alguns cargos que ainda ocupam lhes trazem. Quando o interesse não é o colectivo e a visibilidade pessoal momentânea é mais importante, ficamos apenas com interesses mesquinhos de âmbito local que de uma forma redutora, prejudicam todos quantos pretendem levar o sector cooperativo do vinho sempre mais longe, mas de uma forma estruturada e sustentável.

Corremos neste momento o risco das gerações vindouras nos acusarem de termos sido os coveiros de todo o sector vitivinícola da região da Beira Interior, em detrimento de um lugar na história desta mesma região.

Tivemos a oportunidade de mudar, seguramente para melhor. Figueira Castelo Rodrigo deverá estar consciente das consequências inerentes à sua decisão que ficará registada pela negativa na história local impedindo as reformas e as mudanças tão necessárias que não são fáceis dado o problema específico de cada cooperativa, com hábitos adquiridos através dos tempos, começando nas suas direcções sem a formação adequada aos cargos que exercem, para enfrentar a rigidez dos mercados, as áreas do marketing e para gerirem duma forma eficiente os destinos face aos mercados modernos.

António Bidarra Andrade, Presidente da Direcção da Unacobi

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