Arquivo

A23 e A25 com portagens em 2005

Governo anuncia regime de isenção por «três ou quatros anos» para residentes e empresas locais em deslocações num raio de 30 quilómetros

A Beira Interior não escapou ao fim das autoestradas sem custos para o utilizador (SCUT). O último Conselho de Ministros confirmou o pior dos cenários para automobilistas, empresários e autarcas locais, que estão longe de se contentar com o anúncio de um regime de isenção por «três ou quatros anos» para os residentes e empresas instalados nos concelhos percorridos pela A23 e A25, em deslocações num raio de 30 quilómetros. O sistema de pagamento nestas vias poderá estar em vigor no final do primeiro trimestre de 2005. Entretanto, as concessionárias – a Scutvias e Lusoscut, respectivamente – preparam-se para reclamar compensações por esta alteração contratual enquanto aguardam conhecer melhor as intenções do Estado.

A decisão foi tomada na reunião do Executivo realizada em Coimbra no passado dia 30 com a justificação de servir o «interesse nacional», já que o Governo estima poder libertar por ano com esta medida 1,9 mil milhões de euros «que permitirão concretizar o Plano Rodoviário Nacional». Caso contrário, seria necessário um «aumento de 27 por cento no IRS», avisou o ministro das Obras Públicas. António Mexia disse mesmo que «havia que fazer escolhas, sem as quais seria impossível construir novas autoestradas», pelo que se optou pela introdução do princípio do utilizador-pagador em substituição do regime «contribuinte-pagador» até agora em vigor. Contudo, haverá um regime de isenção, por «três ou quatro anos», para os residentes e empresas instalados nos concelhos percorridos por estas vias em deslocações num raio de 30 quilómetros, que corresponderá «ao triplo» dos percursos médios desses residentes, segundo o ministro. Fica também garantido que a isenção irá manter-se, no final desse período, nas regiões com riqueza abaixo da média nacional após a avaliação do grau de desenvolvimento de cada região beneficiada com as isenções, estando previsto a perda desse benefício para aquelas que atingirem o nível de desenvolvimento médio do país. O ministro foi ainda mandatado para proceder à negociação dos contratos com as concessionárias das SCUT.

Tribunal de Contas crítico das SCUT

O Governo argumenta que, nas actuais condições, o investimento necessário para a construção de rodovias e a assunção dos compromissos das concessões representaria anualmente 1,9 mil milhões de euros para cumprir o PRN. Um valor que, para António Mexia, corresponde a um «investimento necessário anual» de 560 milhões de euros para IP’s (Itinerário Principal) e IC’s (Itinerário Complementar), de 40 milhões de euros para encargos com a transferência de estradas para os municípios, 700 milhões de euros para as rendas das actuais SCUT e de 600 milhões de euros para novas auto-estradas. Prosseguindo as comparações, o ministro adiantou que em termos financeiros a concretização do PRN corresponde à «construção entre 25 e 30 hospitais com 250 camas» ou a um «aumento de 20 por cento» do IVA. «É uma decisão histórica, que evita que o sistema entre em ruptura», garantiu o titular da pasta das Obras Públicas. O modelo SCUT prevê que a construção de autoestradas seja feita por privados, cabendo ao Estado o pagamento de uma portagem (virtual) em função do tráfego registado durante o período da concessão (30 anos).

O modelo, originário do Reino Unido, foi introduzido em Portugal em 1996 pelo Governo de António Guterres, quando João Cravinho era ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território. O Tribunal de Contas, na auditoria às concessões rodoviárias em regime de portagem SCUT, divulgada a 29 de Maio de 2003, criticou o Executivo socialista por todo o processo das concessões destas autoestradas, considerando que «não dá garantias de qualidade técnica ou vantagens financeiras». O Governo de Durão Barroso alegou a 30 de Maio que «se o projecto das SCUT prosseguisse, como previa o anterior Executivo, em 2008 não haveria recursos para manutenção de rodovias» e anunciou a reavaliação de todo o processo para não comprometer «o futuro do Estado». Recentemente, o actual primeiro-ministro, Pedro Santana Lopes, argumentou que é mais justo que as SCUT sejam pagas por quem as utiliza, em vez de serem financiadas por todos os contribuintes, embora tenha referido a criação de isenções de pagamento aos habitantes locais.

Luis Martins

Sobre o autor

Leave a Reply