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A Serra da Estrela e o futuro

Foram dias nevados os dias de Páscoa da Serra da Estrela. O que é bom para o turismo, o que é bom para a economia, o que é bom para a região. Mas certamente não é bom turismo assistirmos a filas intermináveis de carros e engarrafamentos como se estivéssemos na hora de ponta de um cruzamento que calha estar estranhamente a 1.950 metros de altitude. E se não é bom para quem visita a Serra Estrela, certamente também não é bom para um parque natural com um valor ecológico ímpar. Algo, pois, precisa de ser pensado para que, de forma mais consentânea com os valores ecológicos e do desenvolvimento integrado, haja turismo de qualidade e que possa prosseguir acessível a muitos. Parece isto um paradoxo, mas não tem de ser.

Todos os que conhecem um pouco melhor a Serra, quanto mais a conhecem mais tendem a frui-la longe da Torre e das suas pistas de ski. Essa outra Serra da Estrela tem um potencial enorme, mas que tem de ser enquadrado num modelo de interação com a natureza e com as comunidades residentes mais equilibrado. Por isso deve preocupar que, apesar do Parque Natural da Serra da Estrela ser vasto, aconteça ser apenas naquele redor da Torre e pouco mais que se concentrem, e por apenas alguns dias, milhares e milhares de visitantes, como se se deslocassem à primeira praia da Costa da Caparica. A neve e a pista de esqui são um argumento forte, mas haverá realmente outras alternativas?

A candidatura a Geopark global da UNESCO, protagonizada pelo Instituto Politécnico da Guarda junto com 9 municípios da região, vai no bom sentido, procurando dar respostas positivas a esta pergunta e que tenham por centro da preocupação a preservação de equilíbrios, bem como a sua compreensão pelos públicos que deles fruam. E não há razões para pessimismo. Se Arouca, Açores, Terras de Cavaleiros e Naturtejo alcançaram esta classificação, é de esperar que a Serra da Estrela também o consiga, entretecendo objetivos de geoconservação e de educação para uma desenvolvimento integrado com objetivos de turismo.

Mas que outro turismo é possível? Entre outras, duas direções merecem mais atenção. Por um lado, uma Serra da Estrela que privilegie turisticamente a pedonalidade à utilização do carro. Abrandar e descer do carro, para caminhar pela Serra, é ganhar em profusão de experiências e em incorporar-se com o meio. Para isso, importaria uma aposta decidida, que não se faz sem investimento, numa rede de trilhos bem planeada, com pontos de interesse identificados, cartas de pormenor facilmente acessíveis, referências toponímicas, orónimos devidamente localizados, sempre sob um princípio estrito do menor impacto ambiental. Por outro lado, o desenvolvimento de um turismo de convivência com a Serra da Estrela vivida pelas suas comunidades, nas suas atividades e ofícios. Por exemplo, a pastorícia e o fabrico do queijo, dadas não apenas do ponto de vista do museu que conserva o passado, mas de “viveres” que queremos que se conservem no presente e futuro.

Por: André Barata

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