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A lambe copos

Saliências

Num magnífico jantar encontrei um anjo de Deus, uma daquelas faces angélicas com uma pele de porcelana. Uma mulher empolgante que à distancia apreciava com os olhos típicos de um homem “tocado”. Que deliciosa personagem, um pouco cheia, uma tez branca e umas rosáceas na face. Aquela moça era uma heroína de Balzac, um amor de Castelo Branco. Olhava-a embevecido quando a vi erguer os cotovelos e cortar o bife num gesto de perigosa aviação. Depois a garfada muito cheia aproximou-se da boca, que se abriu imensa e o conteúdo foi sendo mordido entre dentadas bem abertas, com visão directa da amilase destruindo as proteínas da carne. A menina angélica devorava com a força de um obreiro, dissecava com a destreza de um talhante, cortava como um barbeiro. Os braços elevados empurravam as pessoas à sua volta. As gargalhadas soltavam-se ainda com um pouco de comida, agora em perdigotos.

Comeu muito bem a menina! Apetite devorador e sede inesgotável. Lançou-se à sobremesa, sôfrega, e de repente pareceu esboçar um leve arroto que cobriu com o guardanapo. Meu Deus, que mais irá acontecer? O anjo ergueu levemente a nádega direita e claramente se soltou deixando o rapaz do lado, já envolvido nos empurrões, derrotado na guerra química. O anjo desfazia-se, a dama descompunha-se. A surpresa contorcia-se entre gargalhadas e espanto. A jovem branca, de faces rosáceas, palitou-se desabrida e coçou as coxas sem decoro. A menina não acertava um gesto de etiqueta, não cumpria uma regra, não levava ao fim uma norma. Marcava o copo de vinho, lambia os bordos açucarados do copo com cocktail. Coçava-se! Meus Deus e se me apaixonava sem ter visto este espectáculo? É assim que alguns vão enganados, não as levam antes a comer.

Por: Diogo Cabrita

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