Curiosamente, é um dos cartazes eleitorais da candidata vencida Ana Manso que melhor resume o principal desafio que agora se coloca ao candidato vencedor Joaquim Valente. Quando me deparei com o cartaz em que se podia ler “Guarda, capital do interior”, fiquei na dúvida. Estaria a candidata a sublinhar o atraso da Guarda face a outras cidades do interior ou a assumir um propósito de liderança para a Guarda no contexto desse mesmo interior? Guarda, capital do interior ou capital da interioridade? Julgo que as duas leituras seriam possíveis. E legítimas. E julgo também que esse é verdadeiramente o desafio fundamental que o novo presidente vai ter que enfrentar desde já. É preciso dizer que, em 30 anos de poder autárquico do Partido Socialista, a maioria do eleitorado do concelho sempre ignorou este julgamento no momento das eleições. Como se ser presidente da Câmara da Guarda equivalesse a ser presidente da Câmara de Terras de Bouro, de Freixo de Espada à Cinta ou de Alguidares de Baixo… Passado mais um acto eleitoral autárquico, e com o voto de confiança depositado numa nova gestão camarária, não vale a pena ignorar que a herança é pesada e que os desafios são muitos. Joaquim Valente tem agora a obrigação de fazer com que a Guarda dê finalmente o salto enquanto cidade e enquanto capital de distrito. O presidente da Câmara da Guarda não tem que ser o presidente do interior, mas tem que ser capaz de se afirmar como voz de uma região que é muito mais vasta do que o concelho. Agora, não pode haver mais subterfúgios. Por um lado, está em causa a qualidade de vida dos habitantes do concelho; por outro, a liderança e a influência junto do poder central com vista a evitar o agravamento das desigualdades entre litoral e interior. O abandono do centro histórico é um escândalo e uma vergonha, e nem o arranjo da Praça Velha – mais do que demorado, como todas as obras na Guarda – atenua o sentimento de frustração quando visitamos outras cidades com perfil semelhante, mesmo em Portugal. Não admira que os turistas passem e andem… É preciso exigir à nova gestão camarária que, de uma vez por todas, assuma a requalificação do centro histórico como prioridade e com estratégia coerente, acima de tudo, por uma questão de qualidade de vida. Que assuma um papel activo no estímulo à revitalização do comércio tradicional em vez de contribuir para encafuar os munícipes nos centros comerciais que se anunciam. Que pense e implemente soluções corajosas e inovadoras para os problemas do trânsito, do estacionamento e do transporte dentro da cidade. Que faça uso da ideia de plataforma logística para atrair as actividades produtivas de nova geração. Que proceda à integração do espaço urbano com o espaço rural e a floresta. As pequenas e médias cidades em Espanha e em Itália são campeãs da qualidade de vida porque apostaram no património, na cultura, nas actividades tradicionais e no ambiente. E naquilo que as grandes cada vez menos podem oferecer: uma política de proximidade que contraria o anonimato das multidões. O TMG é a prova de que é possível criar novas dinâmicas e uma nova face para a cidade, e pelo seu êxito e boa gestão passa, de certeza, grande parte do futuro da Guarda. Por isso mesmo, Joaquim Valente, não queira fazer carreira política com base na resignação dos munícipes de que têm a cidade possível ou, o que é ainda pior, a cidade que merecem.
Por: Marcos Farias Ferreira