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A galinha de ovos de oiro

A neve está na moda. Para quem, como eu, sempre sentiu o apelo pela serra, em especial pelas actividades desportivas que a mesma proporciona, resulta excêntrica toda esta atracção súbita e de massas pela Serra da Estrela. Experimente o leitor, como eu fiz, deslocar-se às pistas de esqui, e vai ver o que é uma autêntica odisseia. Primeiro, são as estradas que se vêm entupidas de tantos carros que mais parece um movimento citadino num dia de jogo da bola. Depois, se entretanto não tiver desistido, vai acabar por encontrar as pistas mas sem lugar para estacionar o carro. Na hora do aluguer do equipamento, a resposta mais provável foi a que a mim me deram. Tudo esgotado, nem esquis, nem botas, nem trenós, nem nada. Uma completa desilusão. Principalmente para as crianças. Ir à serra e acabar por não experimentar a neve é de certeza uma grande desilusão. Depois experimente o leitor tomar um café no bar/restaurante. Vai ser mais uma tarefa difícil. A máquina automática está desligada e para o balcão há uma fila de mais de 30 minutos. Mas as preocupações ainda não acabam aqui. A saída do local é sempre um complicado exercício de paciência e perícia. As paragens são quase contínuas, ou para deixar passar os carros que vêm em sentido contrário, e só passa um de cada vez, ou para deixar sair os que se aglomeram nas bermas da estrada.

De regresso a casa passo mentalmente o filme da má experiência. Tento encontrar explicações para o que vai acontecendo. Porque é que não se criaram estruturas à altura das necessidades? Porque é que não se fizeram parques de estacionamento a distâncias razoáveis? Porque é que tudo é tão rudimentar? Para que servem os organismos de estado, a Região de turismo da Serra da Estrela, o Parque Natural e um sem fim de entidades que gravitam à volta da Serra? E o que dizer da iniciativa empresarial para pôr as pistas de esqui a funcionar. Pelos vistos tudo se reduziu à aquisição de uns canhões de neve e à construção de um armazém de material (pelos vistos insuficiente). E agora até se fala da abertura de um casino na serra, nas Penhas da Saúde. Parecem todas iniciativas desligadas, sem as necessárias infra-estruturas de apoio. Possivelmente visando mais o lucro fácil e imediato do que a criação de condições duradouras de um desenvolvimento sustentado e integrado.

Temo que se continuarmos por este caminho, a atrair para a serra turistas, que não conhecem os perigos que a mesma envolve, sem se acautelarem as condições mínimas de segurança, que um destes dias aconteça uma tragédia. Que milhares de visitantes fiquem retidos na serra sem qualquer tipo de apoio ou de socorro.

A vontade de voltar, afinal o mais importante numa estratégia de marketing e de gestão turística, não é a ideia dominante de quantos têm visitado a Serra nos últimos tempos.

A galinha de ovos de oiro da região corre o risco de ser morta à partida.

Por: Fernando Badana

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