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A esquerda, a moral e Vítor Bento

As reações apressadas e em cadeia têm destas coisas: num ápice sova-se o que nos aparece pela frente, rotula-se por atacado e julga-se sumariamente. É verdade que juntar Vítor Bento a Paulo Mota Pinto e a João Moreira Rato na mesma lista é um erro, porque a soma prejudica as partes. Mas é incrível que não se olhe para o que vale cada um deles. No caso de Vítor Bento, sugiro aos deputados do PS, do PCP e do Bloco que vão ao Pingo Doce e comprem um pequeno livro de Vítor Bento. Vão ficar surpreendidos.

A ida ao Pingo Doce não é por acaso. “Economia, Moral e Política” é um pequeno ensaio escrito por Vítor Bento para a Fundação Francisco Manuel dos Santos em 2011. Li-o na altura e fui buscá-lo à estante este domingo. Aconselho vivamente a leitura do texto, nada pretensioso nem complexo, que explica bem os dilemas do capitalismo na ressaca da crise financeira de 2008.

Uma citação sobre a falta de atomicidade, uma falha grave do nosso capitalismo e que bem podia ser aplicada ao GES: “(…) contrariando o princípio da divergência dos elementos em confronto, promoveu-se uma padronização comportamental dos decisores, que, em geral, estudaram nas mesmas escolas, aprenderam a mesma doutrina, utilizam os mesmos modelos de análise e decisão, pensam da mesma maneira, reagem aos mesmos sinais, fazem as essas previsões e competem com os mesmos benchmarks”.

Outra citação sobre o perigo da cultura dos resultados trimestrais: “”os resultados imediatos, trimestre a trimestre, tornaram-se uma quase obsessão dos gestores, que a esse objetivo transitório, e frequentemente ilusório, tudo sacrificam” .

Podia seguir página abaixo, com exemplos do que pensa Vítor Bento sobre o capitalismo, a crise financeira, a economia, a moral e a política. A palavra moral não surge aqui por acaso nem apenas porque consta do título. Todo o livro é, na essência, um ensaio sobre a moral e como os comportamentos amorais (no sentido em que a esquecem) estão muitas vezes na origem de erros graves.

O livro de Bento não é moralista, é sobre moral, o que é uma coisa bem diferente. Uma coisa que muitos do que os criticaram esqueceram por completo. Preferiram ser moralistas, porque é mais fácil e mais rápido. Mas é incrivelmente mais pobre.

Por: Ricardo Costa

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