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À descoberta de Marialva

O INTERIOR inicia nesta edição uma viagem pelas aldeias rurais da região

Erguem-se as muralhas céu adentro, sem limites, sem tempo. Recortam o azul que inunda a paisagem. No seu interior escombros de histórias passadas, ruas vazias e paredes repletas de segredos. Marialva encerra nos seus limites um planalto de vidas, ecos de memórias e hoje apenas os murmúrios do vento e a altivez da solidão.

Marialva dista sete quilómetros da cidade de Mêda. Esta Aldeia Histórica, num cenário que revela uma das relíquias vivas da ancestralidade portuguesa, transporta os visitantes até às raízes mais profundas da história daquela aldeia e da região. As ruas, ladeadas por edifícios que resistiram à passagem do tempo, conduzem à cidadela cercada pelas muralhas. Segundo reza a lenda, existia naquela aldeia uma rapariga cuja beleza a todos encantava, mas que escondia um terrível segredo: tinha pés de cabra. Todos os rapazes da povoação queriam casar com ela, mas a todos respondia que só casaria com aquele que fizesse os sapatos à medida do seu pé. Havia na aldeia um sapateiro – Baltazar – que para descobrir o segredo de Maria Alva colocou farinha no chão do seu quarto. Pela manhã, quando a donzela se levantou e saiu para dar o seu passeio, as marcas dos seus pés ficaram na farinha. Baltazar, em vez de ir para casa fazer os sapatos para Maria Alva, saiu à rua e apregoou: “Maria Alva tem corpo de gente e pés de cabra”. Ao ver o seu segredo desvendado, Maria Alva subiu ao cimo da torre do palácio e atirou-se de lá.

Lenda à parte, as origens longínquas de Marialva remontam ao tempo da antiga cidade de Aravor, fundada pelos túrdulos no século VI a.C. Com a chegada dos romanos, o nome alterou-se para Civitas Aravorum, que foi reconstruída no tempo de Adriano e Trajano, tendo sido um importante ponto de confluência e cruzamento de vias. Os godos instalaram-se também no monte, primeira ocupação cristã, mudando-lhe o nome para S. Justo. Seguiram-se os árabes, que terão dado à cidadela o nome de Malva, que, reconquistada por D. Fernando Magno de Leão, em 1063, lhe chamou Marialva.

Despovoada pelas lutas da Reconquista, D. Afonso Henriques mandou-a repovoar e concedeu-lhe o primeiro foral (1179). D. Sancho I reconquistou-a em 1200, altura em que o povoado extravasou a cerca amuralhada, formando-se assim o arrabalde que apresenta uma malha urbana de traçado predominantemente medieval, onde proliferam igrejas, capelas, casas quinhentistas e senhoriais, a par de um conjunto de habitações rurais com características típicas beirãs. D. Dinis, que criou a feira em 1286, e D. Manuel, que lhe concedeu Foral Novo (1512), procederam a obras no castelo, transformando Marialva numa das mais imponentes e fortes praças de guerra do reino.

Dada a localização fronteiriça de Marialva – e estimulada pela feira (no dia 15 de cada mês) que concedia diversos privilégios aos moradores e feirantes – iniciou-se no séc. XIII a fixação de judeus, cujo número aumentou durante o reinado de D. Manuel, dando origem à judiaria local. D. Afonso V deu o título de Conde de Marialva a D. Vasco Coutinho (1440), que se destacara nas campanhas militares do Norte de África; mais tarde passou a marquesado com D. Afonso VI (1675), tendo sido primeiro Marquês de Marialva D. António Luís de Menezes, terceiro Conde de Cantanhede, pelo seu papel decisivo na Revolução de 1640. Em 1855 foi suprimido o concelho de Marialva, que passou a integrar o de Vila Nova de Foz Côa. Só em 1872 Marialva foi incorporada no concelho de Mêda.

Em Marialva pode encontrar vários pontos turísticos e patrimoniais. Muitos deles resistiram à natural degradação causada pelo passar dos anos e ainda hoje permanecem naquela que é uma das aldeias mais emblemáticas da região, mas também de Portugal. A antiga Câmara Municipal, a Porta do Anjo da Guarda e o Solar dos Marqueses de Marialva são três dos 15 pontos destacados e que vai querer, com certeza, descobrir. De acordo com o presidente de junta, Luís Miguel, a integração de Marialva no programa “Aldeias Históricas de Portugal” trouxe consigo alguns benefícios, embora peque pela «falta de investimento». «Este programa focou-se muito na recuperação histórica e patrimonial, e obviamente que isso foi muito importante para nós porque as pessoas gostam mais de ver edifícios requalificados do que em ruínas. Contudo, acho que faltou promover o investimento local», confessa o autarca. Nos últimos Censos, em 2011, Marialva contava apenas 255 habitantes.

O que ver em Marialva?

Castelo, antiga Câmara Municipal, Capela de Nossa Senhora de Loures / São João Baptista, Capela de Santa Bárbara, Capela do Senhor dos Passos, Casa da Ajuda, Casa do Leão, Cisterna Quinhentista, Cruzeiro, Fonte de Mergulho, Igreja de Santiago, Igreja de S. Pedro, Pelourinho, Porta do Anjo da Guarda, Posto de Turismo / Casa dos Judeus, Solar dos Marqueses de Marialva.

Sara Guterres Marialva é uma Aldeia Histórica que fica a poucos minutos da cidade de Mêda

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