Nos nossos dias a bolota perdeu a importância e o significado que teve para as populações pré e proto-históricas. Hoje serve, sobretudo, para alimentação do gado. É com ela que se obtém, por exemplo, os melhores presuntos ibéricos. Os nossos vizinhos espanhóis são, mesmo, exímios na promoção dos seus presuntos de bolota, o famoso “pata negra” comercializado em todo o mundo.
O termo de origem árabe – “bulluta” – terá começado a ser utilizado na Idade Média, ainda sob domínio muçulmano. Muito abundante nas regiões do interior, o fruto silvestre continuava a ser usado na alimentação humana mas também na alimentação do gado suíno criado pelas populações cristãs medievais. Os documentos da época medieval são profícuos nas referências aos bosques de sobreiros e carvalhos onde se abrigavam animais selvagens, nalguns casos, ferozes. A toponímia das povoações da Beira Alta refere até à exaustão o “carvalhal”.
Na actualidade, a bolota ainda tem algum uso na alimentação humana em localidades como Ourique onde se prepara um “Bolo de Bolota”1. Mas há muito que a recolecção da bolota deixou de fazer parte do quotidiano. No entanto, a história e, em especial, a arqueologia mostram-nos que o seu papel foi crucial para a sobrevivência do Homem, como vimos em textos anteriores.
Mas como se conservou no registo arqueológico tanta informação deste produto vegetal – incontestavelmente perecível – ao longo de milhares de anos? A resposta está na forma como a bolota foi tratada. Com efeito, os restos de bolotas Pré e Proto-históricas encontram-se, em geral, em lareiras ou em locais que conheceram a acção do fogo e, por isso, puderam conservar-se em diversos sítios arqueológicos da Beira Interior onde os solos ácidos consomem os restos orgânicos no espaço de algumas décadas.
Além disso, o processo de torrefação da bolota era fundamental para a extracção do tanino, uma substância responsável pelo sabor amargo deste fruto. Depois de torradas, as bolotas podiam ser transformadas em farinha para pão ou para a preparação de outros alimentos. É, por isso, que os moinhos manuais de granito estão, quase sempre, associados à presença de bolotas torradas como é o caso do habitat pré-histórico da Malhada (Fornos de Algodres) e dos povoados proto-históricos dos Galegos (Guarda) e do Crasto de São Romão (Seia).
Os restos de bolota são também importantíssimos para a determinação de cronologias absolutas pelo método do C14. São, aliás, os restos mais fiáveis para datação de um sítio arqueológico, juntamente com outras sementes carbonizadas, pois estes produtos vegetais têm uma vida curta, ou seja, foram queimadas em momentos muito próximos da sua colheita.
Por: Manuel Sabino Perestrelo
1 Pode ser consultado no site http://www.ateneu.com/receptes/alentejo_cocina.html