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A Banca e a Política

Espera-se do novo ciclo de financiamento europeu que este seja decisivo para a retoma económica nacional. Espera-se também, dada a preferência prevista pelas zonas mais deprimidas do país, como o interior, ou pelo investimento em empresas, em lugar de grandes obras públicas, que o resultado final seja favorável em áreas como a coesão nacional ou a criação sustentada de emprego. Se pensarmos nos números envolvidos e nos milhares de milhões que irão chegar ao interior e às suas depauperadas empresas, então parece haver motivos para se ter esperança.

Os princípios gerais parecem inatacáveis, mas a forma como vão ser postos em prática levanta algumas dúvidas. Um dos grandes problemas das nossas empresas é o da sua falta de capital. Poucas são as empresas portuguesas, mesmo as que apresentam bons resultados, que não se encontrem pesadamente endividadas. Muitas não conseguem exportar, ou facturar internamente, sem contratos de factoring com seguros de crédito associados. Ambos têm custos elevados, com implicações na margem de lucro. Há ainda as que precisam de contas-correntes caucionadas, usadas primeiro como forma de colmatar falhas de tesouraria e depois para rolar passivo. Outras ainda usam contas de cheques pré-datados, curiosa maneira de conceder crédito em que quem o concede é que suporta os encargos bancários. Quase todas usam contratos de leasing ou renting para renovar equipamentos e viaturas. Todas essas empresas, que são a maior parte das empresas portuguesas, pagam a sua falta de capital com endividamento bancário. Raras são aquelas que se financiam a si próprias, que investem em novos equipamentos com recursos próprios, que constituem ou mantêm reservas financeiras.

Levanta por isso algumas dúvidas a forma escolhida para fazer chegar à economia os dinheiros europeus que aí vêm. Segundo foi já dito, os financiamentos a fundo perdido passaram à história. Os próximos financiamentos vão chegar na forma de crédito bancário, através de um banco de investimento, ainda a criar, deste para a banca comercial e desta para, finalmente, as empresas. Se recordarmos exemplos anteriores, em que linhas de crédito públicas foram destinadas através da banca às empresas, podemos crer que as que quiserem candidatar-se vão ver a banca aproveitar para se cobrar de créditos vencidos ou de dívida a rolar há demasiado tempo em contas caucionadas. Isto é, essas linhas de crédito servirão sobretudo para ajudar a recapitalizar a banca e muito pouco para relançar a economia.

É também por isso que se torna cada vez mais claro que quem manda em Portugal são os bancos e que estes irão mais tarde ou mais cedo começar a formar governos – se o não fazem já.

Por: António Ferreira

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