Portugal, anestesiado, vai vivendo em vez de viver. E também vai morrendo aos poucos. Celebra – e bem – o Dia Mundial da Criança, mas não ambiciona muito mais do que tornar-se num reduto na reforma. Há freguesias do seu retângulo em que não emergiu uma única criança nos últimos cinco anos. Nos primeiros três meses de 2021 nasceram menos 3 mil bebés que no mesmo período do ano passado e, a somar a este declínio, morreram mais 15 mil pessoas. Acha que isto é coisa das próximas gerações e elas, que ainda não votam nem castigam, que resolvam.
Quem o governa continua alegremente abúlico, sem rasgo nem estratégia e preso ao dia seguinte. Teve a maior queda do PIB da União Europeia no primeiro trimestre do ano e está na liga dos últimos nas estimativas do crescimento económico dos próximos anos, ao nível da Macedónia, muito abaixo da Grécia e ultrapassado pela Eslovénia e Eslováquia. Organiza e investe verbas de “Grão capitão” na Web Summit, mas não sai da cepa torta. Sobrevive com quase 665 euros, que é o salário mínimo e se vai tornando quase o salário médio nacional, com mais de 750 mil pessoas a dependerem dessa “esmola”, subindo de 4% do número total de trabalhadores em 2001 para 22% em 2019, mas continua profundamente estatizado e sem apostar nas suas empresas e na sua classe média.
Não repara na sua carga fiscal, que está em máximos de 34,8% do PIB, não liga ao esforço de quem paga impostos, 37% acima do dos alemães, não se apercebe dos 23% de IVA, não dá conta que na fatura de 25 euros de água o consumidor só paga 11 de água ou que na fatura de 70 euros de eletricidade só paga 50 de luz e que as diferenças são taxas, impostos e contribuições, e não se importa que dos 1,5 euros que cobra por cada litro de combustível do mais caro que há na Europa, 90 cêntimos sejam para o Estado, num brutal esbulho às carteiras de quem as tem e que outros países, como a Irlanda, tem pudor em praticar.
Vive a prestações, com endividamentos nunca antes registados e só travados pela pandemia e arrisca a ter de pedir mais emprestado, com a crise social e económica que se espera com o fim das moratórias e com o aumento das insolvências e do desemprego. Vive em austeridade, cujo mentiroso fim propalou por decreto, mas que está aí para durar e magoar. Anuncia um Portugal novo todos os dias, espalhando um bálsamo para adormecer um povo que precisa de mudar e que só não muda de país porque a crise atual é global e os empregos já não abundam noutras latitudes. Permite fugas para outros lugares todos os anos desde 2015, num ritmo que atingiu quase 80.000 pessoas em 2019 e não foi preciso o seu primeiro-ministro ter mandado emigrar ninguém, porque quem sai vai pelo seu pé, por necessidades e por falta de oportunidades pátrias. Então se quem nos governa continua a tratar os imigrantes como são tratados os trabalhadores de Odemira e de muitos outros sítios, os desequilíbrios entre as saídas e as entradas explodem e a Nação esvazia em poucas décadas.
Mas isto não é tema. O que importa é que não há dia em que não venda a ideia de que a vacinação, com o alto patrocínio da Europa, está a correr bem e que a expetativa de um Verão desconfinado, e ainda com mais ingleses, está aí à porta. O resto é fado, futebol e… Fátima, pois o país bem precisa de muita, muita fé.
Um país às esquerdas
«Portugal, anestesiado, vai vivendo em vez de viver. E também vai morrendo aos poucos»