Questões sobre uma Candidatura

Escrito por António Ferreira

Há pouco mais de uma semana estive dois dias em Évora, onde aproveitei para ir a dois dos meus restaurantes favoritos. No meio da conversa com os donos de cada um dos restaurantes perguntei: “Sabe que a Guarda é candidata a Capital Europeia da Cultura em 2027?”. Disseram-me ambos que não, que não faziam ideia, e ambos com ar de “E eu tinha de saber?”. Mas a pergunta mais importante vinha logo a seguir: “E sabia que Évora também é candidata?”. Não, não sabiam.
Para quem nunca tenha saído dos “territórios” do interior, que é assim que se diz agora, Évora é Património Mundial desde 1986 graças ao seu rico e bem preservado património arquitetónico, tem uma universidade e tem uma vida cultural intensa, com atividades em todo o distrito. Se o leitor fosse parte do júri que iria escolher a vencedora, face aos argumentos de uma e outra, qual escolheria?
É verdade que a candidatura da Guarda agrega 17 municípios, de Aguiar da Beira ao Fundão – o que seria uma forma de ultrapassar o problema da escassez de salas de espetáculos e de espaços para mostras ou eventos na sede da candidatura, mas Leiria, também candidata, traz o apoio de 26 municípios e, entre eles, Alcobaça, Batalha, Óbidos e Tomar, por exemplo.
Sonhar não custa, claro, a não ser que o sonho traga uma fatura de milhões, como parece ser o caso da candidatura da Guarda. Convém por isso, antes de gastar dinheiro numa candidatura que se sabe vai ser dispendiosa, ter a certeza do retorno para a região. Ganhando, o retorno parece evidente, nem que seja pelos 25 milhões de euros de dinheiros públicos a que se terá direito. Perdendo, fica-se com a vergonha e a despesa.
Entre as muitas cidades portuguesas candidatas temos, por exemplo, Braga, Coimbra e Faro. Alguém me consegue expor um bom argumento para ser a Guarda a vencedora? Temos melhores infraestruturas que Faro, mais tradição cultural que Coimbra, melhor património arquitetónico que Braga? E Évora? E Leiria? E Aveiro?
É verdade que não é tanto a qualidade de cada cidade que irá ser determinante. Não se trata de um concurso de beleza, assim como não temos de contar com um exercício de piedade. O júri vai apreciar programas de manifestações culturais que valorizem a cultura de cada cidade «e o seu património cultural próprios, bem como o seu lugar no património cultural comum, e associem agentes culturais de outros países europeus, com o fim de estabelecer uma cooperação duradoura».
Qual é então o programa da Guarda? A acreditar no site da internet da candidatura, não há para já nada, mas aceitam-se sugestões (ver https://www.guarda2027.pt/ideas). E qual é o passado histórico do atual executivo da Câmara Municipal da Guarda e antecessor em sede de política cultural? Eu não me recordo de nada particularmente extraordinário, mas se perguntarem a Américo Rodrigues, atual diretor-geral das Artes depois de ter sido posto na prateleira por Álvaro Amaro, ele terá certamente uma ou duas coisas a dizer.

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António Ferreira

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