Pedes-me o mar que não é meu. Pedes-me o Sol que não é meu. Pedes-me o vento que não comando. Pedes-me salários novos e eu luto. Pedes-me que te ajude e eu tento apesar das desilusões. Não me lembro de te ofereceres. Não recordo nenhum dia em que aparecesses na luta que me pediste. Não tenho memória da tua mão quando caíram os cacetes. Também tenho a certeza da tua ausência quando estive com dificuldades.
Com o perdão há algo semelhante. O perdão é uma bênção que cai sobre o lamento, uma força que afoga uma dor, uma mão que afaga o torturador. Recordo como Mandela perdoava. Perdoava mais de vinte anos de presídio. Mandela devia ser beatificado, passar à dimensão santificada pois é um Jesus Cristo observado. Nós vimos como pediu e não lhe deram. Nós testemunhámos como as suas convicções foram maiores que a raiva ou a dor. Nós vimos que a vida lhe passou com frustrações, com incertezas, com dúvidas, mas ele é a afirmação indiscutível do perdão e a dádiva sem retribuição. Morreu no mês passado o seu advogado, mais uma testemunha desta grandiosidade humana que parte e mais um depoimento que fica por escrever com vista à santificação de quem o merecia mais que todos.