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Brincar ao faz-de-conta

Observatório de Ornitorrincos

Uma colecção de crónicas de Luís Fernando Veríssimo foi publicada em Portugal com o título As Mentiras que Os Homens Contam e uma das pequenas histórias ali contadas é paradigmática do cérebro masculino (se assim podemos chamar a um amontoado de neurónios facilmente excitáveis). Um homem casado deixa cair a aliança num buraco de esgoto e, ao analisar a situação, apercebe-se que a mulher não vai acreditar numa história tão pouco credível. Para resolver o problema, chega a casa e explica à mulher que perdeu a aliança porque teve um caso extra-conjugal.

Esta é a realidade do pensamento básico masculino. Os homens não mentem para enganar, os homens mentem porque confiam no seu instinto de sobrevivência, semelhante ao dos organismos monocelulares. Aliás, a biologia tem-se equivocado à procura de semelhanças entre o homem e o chimpanzé. Mais depressa se encontravam pontos de contacto entre a natureza masculina e uma ameba. Embora a reprodução nas duas espécies tenha processos distintos, duvido que algum gajo desdenhasse da possibilidade de se reproduzir através da divisão celular, obtendo de forma quase imediata um compincha para a pesca ou para o jogo da malha. Escusado será dizer que, ainda que o homem se reproduzisse por mitose, o sexo continuaria a ser o desígnio fundamental das vidas masculinas da espécie humana. Até porque os homens preferem as actividades mais recreativas e sem nenhuma finalidade concreta.

A verdade é que as mentiras não são uma forma de enganar as parceiras. São muitas vezes a única forma de as fazer compreender o nosso pequeno mundo. Aliás, muitas vezes são mesmo a única forma de nós, homens, compreendermos a nossa própria existência. Os homens têm demasiada imaginação para as vidas tão simples que levam. Já as mulheres, com as suas vidas preenchidas e complexas, com inteligência superior e a capacidade de compreender todos os pormenores à sua volta, não percebem que um homem possa ser estúpido o suficiente para deixar cair uma aliança pelo buraco do esgoto. Mas a verdade é que somos. E é por isso que mentimos, para não parecermos tão palermas. Para parecermos mais inteligentes do que realmente somos. Já agora, é também por isso que quase não há mulheres na lista dos prémios Nobel da Literatura, na grande filosofia política e no governo do PS.

Um homem pode passar duas horas a discutir o racionalismo e o empirismo, mas chega a casa com a camisa fora das calças porque se desfraldou enquanto subia no elevador e é incapaz de explicar à mulher essa súbita vontade de não sentir a roupa presa no cinto das calças. Tenho a certeza que, ao ler estas linhas, os homens vão perceber exactamente o que escrevi e as mulheres vão pensar: “Querem ver que este gajo nos está a tentar convencer que eles tiram a camisa das calças enquanto sobem no elevador? Olha-me este… Deve pensar que nós andamos a comer gelados com a testa!” É por isso que parece ser muito mais simples explicar que a nossa colega de escritório, uma grandessíssima cabra oferecida, que é como elas classificam “as outras gajas todas”, nos puxou a camisa, com intenções pecaminosas e nós ficámos um bocadinho atrapalhados. Quando digo explicar, refiro-me à forma masculina de o fazer. Que é encolher os ombros à pergunta e deixá-las imaginar exactamente o que descrevi atrás. Imaginar ou recordar-se, porque a verdade é que elas também têm colegas (masculinos) no escritório.

EU VI UM ORNITORRINCO

Jorge Sampaio

De visita a Paris, esclareceu a vontade de ver o “Sim” vencer no referendo sobre a Constituição Europeia. Como ninguém pareceu preocupado com a ingerência de um Presidente estrangeiro em assuntos internos de outro país, Sampaio disse também que a França deve ponderar bem o futuro das mulheres que não depilam os sovacos.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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