O presidente da Câmara de Manteigas foi recentemente apanhado a construir uma moradia sem a respectiva licença no lugar da Regateira, em Sameiro, em plena área protegida e numa zona classificada como Reserva Ecológica Nacional (REN). O Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE) lavrou um auto de embargo da obra e a brigada ambiental da GNR levantou uma participação por incumprimento das regras de construção numa área de grandes condicionantes. O assunto está agora nas mãos dos técnicos da autarquia, na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) e no PNSE, que deverão abalizar os procedimentos e as coimas a aplicar.
O caso tem particularidades muito estranhas. A primeira salta à vista de quem ler a licença de construção, afixada no local, segundo a qual o alvará está condicionado à «apresentação da certidão da Conservatória do Registo Predial, devidamente rectificada relativamente às áreas, antes do termo das obras». Coisa única num país em que é impossível obter uma licença de obras sem o respectivo título de propriedade. Mas as surpresas não se ficam por aqui. José Manuel Biscaia requereu um parecer ao PNSE – concedido – para a remodelação/ampliação de duas casas ali existentes, mas no local o que se vê são as bases de um edifício de raíz para o qual não existe licença. Ainda hoje por lá continuam intactos os dois imóveis que era suposto recuperar. Como se não bastasse esta ilegalidade, o autarca voltou a insistir junto do parque pedindo a alteração de localização das obras só que oito meses depois da emissão da licença de construção. Curiosamente, o PNSE achou «não haver inconveniente» na alteração da localização de uma empreitada destinada alegadamente à remodelação/ampliação de duas casas existentes na Regateira, na margem esquerda do Zêzere, a dois passos do famoso Ski Parque.
O problema para José Manuel Biscaia é que tudo foi recentemente confirmado pela Equipa de Protecção da Natureza e do Ambiente em Zona Específica (EPNAZE) da GNR, que encontrou a trabalhar no local um construtor civil. O flagrante delito deu origem a uma contra-ordenação, a que “O Interior” teve acesso, já que os agentes constataram não haver ali «quaisquer obras relacionadas com os pareceres/requerimento, mas sim uma construção efectuada de raíz». Como se não bastasse, a GNR verificou que a construção está situada na REN, mais concretamente em zona de cheias e de risco de erosão, áreas em que, segundo a lei em vigor, são proibidas obras de urbanização, construção de edifícios, aterros, escavações, destruição do coberto vegetal, entre outras actividades interditas. Uma interdição que a construção de José Manuel Biscaia, aparentemente para uso habitacional, não respeitou. Num caso como este, o cidadão comum tem que pagar uma coima e é notificado para demolir o que já foi feito. Contudo, Biscaia não é um munícipe qualquer e arrisca-se eventualmente à perda de mandato, se assim o entender a Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT), por violação das restrições em vigor na REN e numa área protegida. Confrontado por “O Interior”, o presidente da Câmara de Manteigas recusou a comentar o caso, dizendo apenas estar a aguardar o fim do processo.
Luis Martins