As neurotrofinas são uma família de fatores cruciais para o desenvolvimento e a manutenção do sistema nervoso, e foi sugerido que os genes que codificam os seus recetores poderiam estar relacionados com a criatividade. O fator de crescimento nervoso (NGF do inglês, “nerve growth factor”) foi descoberto e caracterizado no princípio dos anos 50 do século passado por Rita Levi-Montalcini, laureada com o Prémio Nobel da Medicina em 1986 por essa descoberta. Levi-Montalcini foi um exemplo de perseverança, inteligência e generosidade, e uma cientista lutadora como poucas. Nasceu em Turim a 22 de abril de 1909, numa família judia notável pelas suas realizações. Convenceu o pai, o engenheiro Adamo Levi, a deixá-la ingressar na Faculdade de Medicina. Quando rebentou a IIª Guerra Mundial, as perseguições aos judeus obrigaram-na a sair de Itália e a fixar-se em Bruxelas, onde colaborou com o Instituto Neurológico durante um ano. Em 1940 voltou a Itália, mas sete anos depois partiria para os Estados Unidos onde, durante 30 anos, realizou investigação e foi docente na cátedra de Neurobiologia na Universidade de St. Louis.
A sua descoberta do fator de crescimento nervoso, uma proteína que modula o crescimento, a reparação e a sobrevivência dos neurónios, tem uma enorme relevância já que os fatores neurotróficos são “candidatos” terapêuticos promissores ao tratamento de perturbações caracterizadas pela morte prematura de neurónios, como as perturbações degenerativas.
No entanto, a figura de Levi-Montalcini vai muito mais além do seu mérito científico. Soube aliar valores que, ainda hoje, não são fáceis de encontrar entre os cientistas. Aventureira, criativa, ambiciosa, cosmopolita, solidária com a sociedade, envolvida em programas de educação em África e senadora vitalícia da República Italiana, foi uma cientista que escolheu não ficar fechada no seu nicho, mas lutar por aquilo em que acreditava: os valores universais da procura da verdade, do bem e da beleza.
Hoje, quando ainda se debate a plena integração social das mulheres, continua a ser admirável que Rita Levi-Montalcini tenha sido capaz de se integrar como membro de pleno direito na classe científica e na sociedade civil numa época com costumes que marginalizavam as mulheres com estereótipos de feminilidade e preconceitos que as subestimavam.
Cientistas como Rita Levi-Montalcini são uma referência inspiradora para os seus colegas das novas gerações, carentes de figuras femininas triunfadoras. E esse é um dos fatores que podem favorecer uma sociedade mais justa e equitativa, e atuar como modelos positivos.