O regime democrático em que nos encontramos, define que è através da vontade popular que se decidem as soluções governativas, no quadro da Constituição vigente, aprovada no Parlamento.
Daqui resulta que os governos, desde que obtenham uma maioria parlamentar estável, dispõem de um período temporal de quatro anos para aplicar as várias politicas dos seus programas de acção, na expectativa de que, no final, alcancem uma boa parte dos objectivos a que se haviam proposto, e constituem os seus compromissos para com os eleitores.
Toda esta concepção da organização política do estado e da sociedade, faz sentido e é partilhada e entendida por todos os cidadãos.
Nos últimos anos, a complexidade e diversidade dos problemas com que o nosso país se confronta, impõe que muitas das soluções que para cada um deles se define, possam ter que assumir aspectos penosos e menos populares, impondo sacrifícios hoje, como condição para um amanhã melhor.
Assim, qualquer alteração deste modo de funcionamento da nossa democracia, tanto na forma como no tempo, coloca em risco os objectivos nacionais de qualquer solução governativa, penalizando-nos a todos com o assumir dos custos das obras inacabadas e induzindo em mau juízo os seus autores.
É neste contexto que vejo a intervenção do Senhor Presidente da Republica ao dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, coincidentemete à eleição de uma nova equipa dirigente no Partido Socialista e após quatro meses de governação do actual executivo.
Mas se este “rebuçado” não bastasse, o mais alto dignatário da nação e supremo garante da nossa ordem democrática, vem agora descobrir, no seu discurso de ano novo, que afinal os problemas com que Portugal se debate são aflitivos e devem impor um acordo entre os maiores partidos, ou seja a concordância mútua face a um conjunto de medidas que venham a ser aplicadas e que seguramente não serão populares, para aquele partido que tiver a maioria.
Apetece perguntar se há um ano a esta parte tais problemas não existiam e se, nessa altura, tal proposta de acordo, não deveria ter sido apresentada.
A resposta, na minha humilde opinião, está no facto de há um ano, esta iniciativa, a ter sucesso, vir a corresponsabilizar o Partido Socialista em muitas das medidas impopulares tomadas pela actual maioria, ao passo que se ela for aceite nestes próximos tempos, haverá hipótese de produzir resultados opostos, ou seja levar o PSD a apoiar as medidas impopulares que um eventual governo do PS irá ter forçosamente que aplicar.
Confesso a minha perplexidade perante estas subtilezas políticas, às quais acrescento o meu desgosto por ver que tudo isto não faz mais que agravar as sucessivas e acumuladas crises em que nos vamos cada vez mais mergulhando, ficando-me a convicção de que com esta dissolução do Parlamento, o Senhor Presidente da Republica, está também a ajudar a diluir a nossa democracia.
Por: Álvaro Estêvão