Eleições legislativas, Assembleia renovada, Governo em funções.
Ao contrário do que seria de esperar, não foi a discussão do Programa de Governo o tema que marcou este primeiro mês parlamentar.
A oposição à direita e os partidos à esquerda do PS limitaram-se a cumprir os serviços mínimos, reservando-se para a batalha do Orçamento. Ninguém teve a ousadia de insinuar, muito menos de propor, a rejeição do programa, maioritariamente, sufragado pelos portugueses a 6 de outubro, com o voto de confiança reforçado ao primeiro-ministro António Costa.
Rejeitar o Programa de Governo era uma quase impossibilidade prática nos termos da Constituição. Desde logo porque demitir um Governo acabado de sair de eleições era violar o princípio constitucional de que Portugal é um Estado democrático baseado na soberania popular. Depois porque não há uma alternativa política séria, credível, neste quadro parlamentar.
Finalmente, porque a Assembleia não pode ser dissolvida nos seis meses posteriores à sua eleição. Num país que tem feito da estabilidade política um trunfo decisivo à recuperação da economia, ao reforço do rendimento das famílias, à criação de emprego, criar problemas de governabilidade seria uma irresponsabilidade total e sem perdão.
Ser contra as maiorias absolutas para fomentar o diálogo e as parcerias estratégicas pode não ter passado de uma jogada tática que, como António Costa previu, podia replicar uma ingovernabilidade à espanhola, ou fenómenos extremistas de grupos inorgânicos, à francesa.
Como a inevitabilidade da aprovação do Programa do Executivo não era notícia, depressa se encontrou uma novidade e se transformou um não assunto no tema central do debate político. Os portugueses sempre gostaram muito de ajudar e defender os pequeninos, os coitadinhos. Então não é que os marotos dos políticos querem calar à força os três deputados dos três novos partidos, que, contra tudo e contra todos, ganharam um lugar em S. Bento?
Do nada surge uma verdadeira cruzada da liberdade contra a mordaça! Não os deixam falar, não lhes dão tempo para usar da palavra em todos os debates, o regimento não prevê estas situações, um deputado não tem os direitos de um grupo parlamentar, eram alguns dos protestos da histeria coletiva, bem fomentada por comentadores arregimentados para dar o conveniente “fogo à peça”.
Como tudo isto lhes convém, os “pobres excluídos” do sistema deixaram-se instrumentalizar e manipular politicamente. Vale tudo para ter tempo de antena nas televisões e nos jornais. Até onde vai a hipocrisia e o sensacionalismo no debate político…
A Assembleia da República tem 230 deputados todos eleitos democraticamente por voto secreto e livre. São todos iguais, não pode haver deputados de primeira e deputados de segunda. Também eu fui eleito com votos do povo de um território despovoado e abandonado, que precisa de ter voz e fazer-se ouvir.
Até agora e em plenário ainda só falaram escassas três dezenas de parlamentares. Os outros 200 tiveram de ouvir e calar e muito bem. Porquê? Porque, segundo as regras em vigor, ainda não tiveram tempo disponível.
Mas esses três novos deputados das três novas forças políticas com assento parlamentar já falaram várias vezes em vários dias… Quem quer calar quem?
Não vale a pena armar ao coitadinho, inventar papões e vitimizar-se; deixem-se de ameaças veladas e de birras. Os deputados têm limitações, até constitucionais, no exercício do seu mandato. É igual para todos.
Li no “Expresso” que os pequenos partidos não estão dispostos a largar a guerra aberta no Parlamento. Se assim for, então a situação é mesmo “escabrosa”. Em Democracia não vale tudo!
* Deputado do PS na Assembleia da República eleito pelo círculo da Guarda