Agora é a sério. Álvaro Amaro renunciou à presidência da Câmara da Guarda para tomar posse como deputado ao Parlamento Europeu (estava com o mandato suspenso). E se a sua eleição (e tomada de posse) como eurodeputado é o corolário de 40 anos de vida política ativa daquele que é um dos mais consistentes profissionais da política em Portugal, os dois processos em que é arguido ofuscam o brilho de uma longa carreira. O próprio recusou (em declarações a O INTERIOR)) que sai pela porta pequena, mas a sua saída da Câmara da Guarda, a meio do mandato, fica manchada pela indesejada acusação de corrupção.
Mas o balanço sobre a passagem de Amaro pela autarquia da Guarda, até à suspensão do mandato e constituição de arguido em dois processos, foi marcado por um protagonismo nacional inaudito. Aliás, a marca mais forte de quase seis anos de presidência. A passagem pela Guarda permitiu a Álvaro Amaro recuperar protagonismo nacional (que Gouveia nunca lhe deu) e dar-lhe espaço nos corredores do poder nacional, de que a Guarda pouco beneficiou. Para isso houve mérito político do ex-autarca que aproveitou como ninguém a interioridade para com o seu movimento brilhar, falando das disparidades regionais e colhendo um protagonismo extraordinário, se bem que inconsequente para a mudança de paradigma sobre o despovoamento, o investimento no interior ou a correção de assimetrias.
O ex-presidente da Câmara da Guarda deixou para trás uma cidade mais “arrumada”, uma autarquia saneada financeiramente (ainda que não pagando a água que cobrou e cujo fornecedor reclama cerca de 30 milhões de euros), a autoestima pelas nuvens e uma afirmação nacional da Guarda. Mas o mais relevante e estruturante da passagem pela Guarda de Álvaro Amaro foi a capitalidade conseguida com a sede da Comunidade Intermunicipal Beiras e Serra da Estrela na cidade. Também o apoio e a construção das instalações da Comissão Vitivinícola. E alguns eventos como a FIT e a Cidade Natal. E vários projetos ou intenções. Do Quarteirão das Artes, de que ainda não se conhece o projeto anunciado há quase três anos, aos passadiços do Mondego, da ligação da rotunda da Ti Jaquina à Viceg ou da ligação à Sequeira (ambos projetos com dezenas de anos e que continuam a não passar de intenções repetidamente anunciadas, mas que tardam em sair do papel) passando pela intenção de construir um pavilhão multiuso ou a candidatura à Capital da Cultura de 2017 (para o que o SIAC2019 deu uma enorme ajuda, que as festas “popularuchas” de S. João não conseguiram ofuscar). Três rotundas novas e decoração e embelezamento em mais três (e mais uma onde o comboio tarda em chegar) – na inauguração de uma das requalificações, a da “mão”, no cruzamento da Viceg com a estrada do Rio Diz, Amaro mostrou de forma vexatória o seu ódio visceral a este jornal e à liberdade de expressão exibindo a primeira página de O INTERIOR, para júbilo dos seus lacaios, enquanto gritava que era mentira que as rotundas tivessem custado meio milhão de euros, como titulávamos; custou mais de 497 mil euros, como demonstrámos na semana seguinte.
Álvaro Amaro deixou para trás uma cidade melhor, mas com um centro histórico abandonado e uma Praça Velha moribunda (onde a autarquia terá de adquirir com urgência duas casas em ruínas para evitar uma maior vergonha à cidade). Uma Guarda sem novas empresas (a PLIE continua adiada e com empresas que já cá estavam); um Politécnico a precisar de camas para novos alunos, mas por mero protagonismo do ex-autarca, a oposição da Câmara à cedência de uma Pousada encerrada há seis anos; um espaço de feira cheio de matagal e com a feira a subir ao centro um domingo por mês sem qualquer impacto positivo na vida da cidade; uma piscina por concluir na barragem do Caldeirão… E um Hotel de Turismo que continua fechado.
E um legado político difícil, com a casa a pegar fogo, pelas diferenças entre o sucessor na presidência, Chaves Monteiro, e o novo vice Sérgio Costa. Pior, no PSD vários barões são assinalados e em surdina tentam ocupar lugar numa corrida que já começou: a sucessão eleitoral de Amaro nas autárquicas de 2021. Enquanto isso, o PS, sem estratégia para a autarquia, espera ver cair o poder na rua e tirar proveito da ineficiência e inaptidão política de um PSD órfão de Amaro. Álvaro Amaro fugiu para Bruxelas e quem cá fica que se entenda.