1 – Aproxima-se o ciclo eleitoral e intensifica-se a atividade partidária que uns chamam ação política e outros preferem classificar de propaganda. A moção de censura ao Governo apresentada pelo CDS, discutida e votada há uma semana no Parlamento, surge precisamente neste clima pré-eleitoral já iniciado e que vai durar até às legislativas de 6 de outubro.
Quanto às críticas sobre a oportunidade, ou até legitimidade, da iniciativa parlamentar centrista oriundas quer das forças da atual maioria de esquerda, quer do PSD, importa ressalvar que em mais de três dezenas de censuras apenas uma produziu efeitos diretos – a moção do PRD que derrubou o primeiro Executivo de Cavaco Silva, abrindo a porta a duas maiorias absolutas cavaquistas e ao princípio do fim do partido promovido por Ramalho Eanes.
Mas houve também deputados que lamentaram a perda de tempo inerente à discussão de uma moção previamente fracassada, considerando que haver mil e uma outras questões mais relevantes a tratar. Foi também na semana passada que o líder parlamentar social-democrata Fernando Negrão defendeu a «revisão regimental» do Parlamento para combater perdas de tempo como quando se põe todo um plenário a tratar temas como as quotas de pesca do peixe-espada.
Numa Assembleia da República cansada de tantas vezes discutir aquilo que desconhece e que é tão propícia à ausência de deputados em serviço noutras mais relevantes funções privadas ou públicas, considerar-se despiciendo debater uma censura que (independentemente de se concordar com os argumentos invocados) é politicamente justificada, menoriza o papel do Parlamento e, em consequência disso mesmo, dos próprios agentes políticos.
2 – O debate da moção foi interessante. Pela segunda vez na legislatura, Bloco, PCP, Verdes e PAN juntaram-se ao PS para salvar o Governo. Pela segunda vez, a direita censurou o Executivo, mas se em 2017 o fez convicto, desta feita o PSD preferia não ter sido obrigado a fazê-lo.
Assunção Cristas insistiu na estratégia de afirmação como líder da oposição, voltou a colar Rui Rio a António Costa e apostou em desgastar um Governo fragilizado pelo crescendo de contestação social. A maioria parlamentar de esquerda respondeu censurando as motivações de Cristas, reduzidas a mera manobra eleitoralista num cenário de fragmentação à direita – ascensão da Aliança e de outras pequenas forças como o populista Chega. O CDS ripostou expondo as incongruências da “geringonça”, lembrando que os bloquistas e comunistas que tanto criticam a política do Governo são os mesmos que o salvam.
3 – A estratégia do CDS parece fazer sentido à luz das sondagens. A mais recente da Aximage mostra o PS (e Costa) em queda e o PSD estabilizado (sendo que Rio ganhou popularidade) e sem conseguir tirar partido da perda dos socialistas. Assim, os centristas tentam ganhar no centro-direita os votos de descontentamento do eleitorado que, apesar de habituado a votar PSD, está insatisfeito com a liderança de Rio. Em simultâneo, Cristas faz controlo de danos por antecipação para evitar perder votos para os partidos emergentes à direita.