Volvidos sete meses sobre a tragédia de outubro, o Presidente da República esteve no concelho de Gouveia, na segunda-feira, para acompanhar a evolução do processo de recuperação após os incêndios. A visita de Marcelo Rebelo de Sousa durou mais de cinco horas e uma das paragens foi a freguesia de Melo, cuja Farmácia Central foi totalmente destruída pelas chamas na fatídica noite de 15 de outubro.
Mal se chega a Melo, a paisagem negra não deixa margem para dúvidas: o fogo passeou-se por onde quis. Os campos verdes foram destruídos pelas chamas, mas no centro da aldeia também houve prejuízos. A Farmácia Central está hoje devoluta por força do fogo. Depois de passar pela estrada municipal que liga Vila Nova de Tazem a Lagarinhos, Gouveia e Folgosinho, Marcelo Rebelo de Sousa esteve naquela freguesia para se inteirar dos trabalhos de recuperação.
«Têm estado a ser momentos muito difíceis», confessou Isabel Coelho, que desde a fatídica noite de 15 de outubro está a laborar na Junta de Freguesia de Melo. Viveu de perto o horror do pior dia de incêndios do ano, quando as chamas vinham de todos os lados, até do céu: «Parecia chuva de fogo. Eram como que bolas de fogo que vinham de cima, o vento era imenso», recorda a farmacêutica, segundo a qual «a dimensão era tanta que mesmo estando toda a gente, se calhar, era impossível combater este fogo». Baixar os braços talvez fosse o caminho mais fácil, mas Isabel Coelho optou pelo mais difícil. «Já fiz a candidatura ao programa REPOR», conta a proprietária, acrescentando que teve que comprar os escombros. «Eu gostaria que [o processo] fosse muito mais célere, mas compreendo que há muitas outras coisas que têm que ser analisadas. Comprei a farmácia em 89, fui eu que fiz todo o espaço interior. Ainda hoje me custa muito passar aqui. Foi a minha vida toda e de repente ficou tudo destruído», lamenta.
Um testemunho ouvido pelo Presidente da República, que seguiu depois para o quartel dos bombeiros de Gouveia e para uma sessão solene nos Paços do Concelho, onde Marcelo Rebelo de Sousa deixou uma mensagem de solidariedade e congratulou-se pelo otimismo de quem foi afetado pela tragédia. «As pessoas não esquecem o que se passou, mas olham para a frente, mais do que olham para trás», afirmou o Chefe de Estado, que destacou «a fibra e heroísmo» das populações e «a capacidade de não apenas manifestarem coragem no instante, mas manifestarem determinação continuada dia após dia, semana após semana, mês após mês». E ressalvou: «Não desistiram, não desfaleceram, não duvidaram que era preciso seguir em frente». Mas dos obstáculos é preciso fazer oportunidades e Marcelo Rebelo de Sousa admitiu ter reencontrado a felicidade: «Isto são lições de vida. Preferia não as ter vivido? Preferia. Preferia que o país tivesse saltado por cima daqueles meses entre junho e outubro», confessou, constatando que o que se passou foi também uma «lição de coragem, de persistência, de determinação de querer construir um futuro diferente».
Presidente da República acredita num futuro melhor
Quanto ao futuro, Marcelo Rebelo de Sousa disse acreditar que, «com a conjugação de forças, saberemos construir um futuro muito melhor do que o passado que tivemos, muito melhor do que o passado recente que vivemos. Sem comparação, sem repetição, sem paralelo». «É desse futuro, que já começou, que aqui falamos hoje. Demora tempo, demora. Aqui é uma casa que está adjudicada, mas ainda não começou a construção, ali já há uma decisão, mas falta agora desbloquear mais verbas para a concretização plena. Acolá é o maior atraso porque a situação é mais complexa», enumerou o presidente, acrescentando que nem tudo é mau e que «mais além é alguém que já está realojado e que diz: “estou feliz na minha casa”».
Já para o presidente da Câmara Municipal de Gouveia a presença do Chefe de Estado no concelho foi «um estímulo»: «Com aquilo que vamos fazendo agora em termos de intervenção, vamos certamente estar melhor equipados e robustecidos em meios humanos para podermos fazer trabalho preventivo, de rescaldo e, eventualmente, de ataque», afirmou Luís Tadeu, declarando que o que «quisemos mostrar hoje foi que este povo conseguiu dar a volta».
Marcelo Rebelo de Sousa satisfeito com esforço de prevenção
Ao percorrer o concelho de Gouveia, o Presidente da República reconheceu que continua a haver casos de árvores cujos ramos batem nas estradas, mas, ainda assim, mostrou-se satisfeito com o trabalho de prevenção que tem vindo a ser feito, destacando o esforço das populações. «A Câmara Municipal, as freguesias, as populações estão a trabalhar. Agora, é uma corrida contra o tempo», disse Marcelo Rebelo de Sousa, para quem «está a ser feito um grande esforço este ano para prevenir». Nesta visita, o presidente verificou os trabalhos de limpeza das faixas de combustíveis na estrada municipal entre Vila Nova de Tazem e Lagarinhos, passou por habitações afetadas pelos fogos, contactou com algumas famílias realojadas e conheceu a empresa Albertino e Filhos, em Folgosinho, cujo prejuízo ascendeu aos 350 mil euros.
Sara Guterres